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Vol. 86. Núm. 3.
Páginas 308-314 (Maio - Junho 2020)
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Vol. 86. Núm. 3.
Páginas 308-314 (Maio - Junho 2020)
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Open Access
Endoscopic cartilage tympanoplasty: full thickness and partial thickness tragal graft
Timpanoplastia endoscópica com enxerto de cartilagem tragal de espessura parcial ou total
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Kartik Parelkara,
Autor para correspondência
kartikparelkar@gmail.com

Autor para correspondência.
, Vandana Thorawadea, Hetal Marfatiab, Devika Sherec
a Grant Government Medical College & Sir J.J. Hospitals, Mumbai, India
b K.E.M. Hospital, Department of ENT, Parel, Mumbai, India
c Rajiv Gandhi Medical College & Chhatrapati Shivaji Maharaj Hospital, Kalwa, Thane, India
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Tabela 1. Comparação da integração do enxerto entre enxerto de espessura total (A) e enxerto de espessura parcial (B)
Tabela 2. Audição pré‐ e pós‐operatória em enxertos de espessura total e enxertos de espessura parcial
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Abstract
Introduction

Cartilage is the grafting material of choice for certain disorders of the middle ear. The indications for its routine use remain controversial due to the possible detrimental effect on post‐operative hearing.

Objective

The present study was carried out to report a personal experience with “tragal cartilage shield” tympanoplasty to compare the results, in terms of graft uptake and hearing improvement, of endoscopic cartilage shield technique using either partial thickness or full thickness tragal cartilage for type 1 tympanoplasty and to highlight the tips for single‐handed endoscopic ear surgery.

Methods

Fifty patients with safe chronic suppurative otitis media, assisted at out‐patient department from February 2014 to September 2015 were selected. They were randomly allocated into two groups, 25 patients were included in group A where a full thickness tragal cartilage was used and 25 patients included in group B where a partial thickness tragal cartilage was used. Audiometry was performed 2 months after the surgery in all cases and the patients were followed for one year.

Results

Out of the total of 50 patients 39 (78%) had a successful graft take up, amongst these 22 belonged to group A and 17 belonged to the group B. The hearing improvement was similar in both groups.

Conclusion

This study reveals that endoscopic tragal cartilage shield tympanoplasty is a reliable technique; with a high degree of graft take and good hearing results, irrespective of the thickness. Furthermore, the tragal cartilage is easily accessible, adaptable, resistant to resorption and single‐handed endoscopic ear surgery is minimally invasive, sutureless and provides a panoramic view of the middle ear.

Keywords:
Cartilage
Endoscopic
Tympanoplasty
Perforation
Tympanic membrane
Resumo
Introdução

A cartilagem é o material de enxerto de escolha no tratamento cirúrgico de certas condições clínicas da orelha média. Devido ao possível efeito prejudicial na audição pós‐operatória, as indicações para seu uso rotineiro ainda são controversas.

Objetivo

Relatar a experiência dos autores com a timpanoplastia tipo 1 endoscópica usando cartilagem tragal e comparar os resultados entre a cartilagem tragal com espessura parcial e espessura total, em termos de integração do enxerto e melhoria da audição. O estudo também buscou apresentar sugestões para cirurgia endoscópica de orelha média com uma única mão (single‐handed endoscopic ear surgery).

Método

Foram selecionados 50 pacientes com otite média crônica supurativa, atendidos neste ambulatório entre fevereiro de 2014 e setembro de 2015, alocados aleatoriamente em dois grupos: 25 pacientes foram incluídos no grupo A, no qual uma cartilagem tragal de espessura total foi usada e outros 25 pacientes foram incluídos no grupo B, no qual foi usada uma cartilagem tragal de espessura parcial. Em todos os casos, uma audiometria foi feita dois meses após a cirurgia; os pacientes foram acompanhados por um ano.

Resultados

Dos 50 pacientes, o enxerto foi bem‐sucedido em 39 (78%), entre os quais 22 pertenciam ao grupo A e 17 pertenciam ao grupo B. A melhoria da audição em ambos os grupos foi muito semelhante.

Conclusão

O estudo indicou que a timpanoplastia endoscópica com cartilagem tragal é uma técnica confiável, com alto grau de integração do enxerto e bons resultados de audição, independentemente da espessura usada. Além disso, a cartilagem tragal é facilmente acessível, adaptável e resistente à reabsorção; a cirurgia endoscópica é minimamente invasiva, sem sutura e proporciona uma visão panorâmica da orelha média.

Palavras‐chave:
Cartilagem
Endoscópico
Timpanoplastia
Perfuração
Membrana timpânica
Texto Completo
Introdução

A cartilagem tragal é frequentemente usada em cirurgias de revisão, reconstruções aticais, atelectasias e em casos de suspeita de disfunção da tuba auditiva. O uso de cartilagem tragal em cirurgias da orelha média não é um conceito novo, mas ganhou popularidade no mundo inteiro na última década. A principal razão por trás dessa aceitação não é apenas sua confiabilidade e estabilidade, mas também a crescente demanda por procedimentos minimamente invasivos. A cartilagem tragal é um enxerto excelente, especialmente no caso de timpanoplastias endoscópicas. A abordagem transcanal não deixa cicatriz e o campo é incruento. Como a cartilagem é relativamente rígida, pode ser colocada com uma única mão, com facilidade e precisão. A principal controvérsia no uso desse enxerto é sua espessura. A literatura apresenta poucos relatos sobre os benefícios acústicos do fatiamento da cartilagem tragal. Este artigo teve como objetivo discutir a técnica de cirurgia endoscópica de orelha média com uma única mão (single‐handed endoscopic ear surgery) e as vantagens e desvantagens de fatiar a cartilagem.

MétodoPopulação e avaliação

De fevereiro de 2014 a setembro de 2015, 50 pacientes (21 mulheres e 29 homens, faixa de 18 a 70 anos) atendidos no ambulatório de otorrinolaringologia de um hospital terciário foram submetidos a timpanoplastia endoscópica com cartilagem tragal.

Pacientes com otite média crônica supurativa e perda auditiva condutiva foram incluídos. Aqueles com infecção ativa, perda auditiva sensorioneural, perfurações recorrentes e comorbidades, tais como diabetes ou comprometimento do sistema imunológico, foram excluídos.

Os pacientes foram alocados aleatoriamente aos grupos A e B (25 pacientes em cada grupo). Os pacientes do grupo A foram submetidos a timpanoplastia endoscópica tipo 1 com enxerto de cartilagem tragal de espessura total (∼ 0,9mm), enquanto os do grupo B foram submetidos ao mesmo procedimento com enxerto de espessura parcial (∼ 0,4mm). Os pacientes apresentavam orelha seca por pelo menos dois meses antes da cirurgia e a cadeia ossicular intacta.

Em ambos os grupos, os seguintes parâmetros foram avaliados dois meses após a cirurgia: taxa de integração do enxerto e melhoria da audição. Após essa avaliação, os pacientes foram acompanhados em exames de rotina por até um ano. Sucesso foi definido como fechamento da perfuração, sem medialização ou lateralização, e boa vascularização no enxerto de cartilagem. Falhas foram definidas como perfuração residual/recorrente e nenhuma melhoria auditiva ou deterioração na audição. Em todos os casos, um audiograma de tons puros (ATP) foi usado para calcular a audição média a 500, 1.000 e 2.000 HZ no período pré‐operatório e dois meses após a cirurgia. O comitê de ética em pesquisa desta instituição aprovou o estudo (UIN: 3256); todos os pacientes assinaram um termo de consentimento.

Procedimento cirúrgico

Todos os pacientes foram submetidos a uma meticulosa avaliação pré‐anestésica e a uma endoscopia nasal de rotina. A orelha média foi examinada com um endoscópio de 4mm de grau zero e um ATP foi feito no período pré‐operatório. As timpanoplastias foram feitas sob anestesia local com infiltração com lidocaína a 2% e adrenalina, suplementada por sedação quando necessário. Uma incisão em forma de U invertido foi feita na pele sobre o trago, deixou uma margem de 2mm no rebordo da cartilagem. O retalho de pele em forma de U invertido foi então descolado e um enxerto de cartilagem tragal juntamente com pericôndrio foi colhido em ambos os lados (fig. 1). O local de onde o enxerto foi colhido foi umedecido com uma peça de merocel encharcada com adrenalina e o retalho de pele foi reposicionado.

Figura 1.

Extração da cartilagem tragal de espessura total com pericôndrio em ambos os lados.

(0,11MB).

Com um endoscópio de zero grau de 4mm, a perfuração foi visualizada e as margens fibróticas foram retiradas para promover um bom fluxo capilar. Uma microfoice foi usada para esse propósito. Hemostasia e um bom efeito anestésico foram obtidos com lidocaína a 4% e peças de merocel embebidas em adrenalina pura. O enxerto foi moldado e dimensionado de acordo com a anatomia local e um pequeno entalhe em forma de V foi feito na posição de 12 horas. Em pacientes do grupo A, usou‐se cartilagem com espessura total e pericôndrio em ambos os lados, enquanto os pacientes do grupo B receberam enxerto em fatias de espessura parcial (∼ 0,4mm). A lâmina de cartilagem fatiada apresentava pericôndrio apenas em um lado, com concavidade para esse lado. Um fatiador de cartilagem foi usado para cortar uniformemente o enxerto e medir sua espessura exata (fig. 2).

Figura 2.

Cortador de cartilagem usado para fatiar uniformemente a cartilagem tragal e o microbisturi horizontal arredondado e vazado, acoplado à ponta de aspiração usado em SHEES.

(0,15MB).

A abordagem de Rosen foi adotada e o retalho timpanomeatal (TM) foi descolado com bisturi horizontal arredondado vazado e com aspirador acoplado, especificamente usado para SHEES (fig. 2). Quando o ânulo foi descolado, a mobilidade ossicular foi verificada e uma peça de gelfoam foi mantida na região do seio timpânico e da abertura da tuba auditiva.

O enxerto foi então colocado sobre o cabo do maléolo e sob o ânulo, como a técnica underlay. No Grupo B, a lâmina de cartilagem fatiada foi colocada de tal forma que o lado com pericôndrio intacto ficasse lateral. O retalho TM foi então posicionado; subsequentemente, o meato externo foi preenchido com esponja hemostática absorvível e uma peça de merocel. A pele recolocada sobre o trago não foi suturada. Um pequeno curativo de algodão foi feito externamente.

Cuidados pós‐operatórios

Os pacientes foram orientados a tomar precauções quanto à água e evitar assoar o nariz vigorosamente. O curativo externo com algodão e o merocel do meato externo foram removidos uma semana após a cirurgia; nesse momento, iniciou‐se tratamento com instilação auricular de medicação antibiótica associada a corticosteroide. Antibióticos orais foram mantidos por uma semana. Quanto à esponja hemostática absorvível, ela foi deixada para se dissolver gradualmente. Os pacientes operados foram examinados uma semana, três semanas e dois meses após a cirurgia. O ATP foi repetido aos dois meses, quando o enxerto viável estava visível e o paciente se encontrava assintomático. Esses pacientes foram submetidos a exames de rotina por até um ano após a cirurgia.

Pacientes com infecção do trato respiratório superior e otite média com efusão no pós‐operatório foram tratados com sprays nasais com corticosteroide; foi feito um esforço para evitar que essas condições dificultassem a integração do enxerto.

ResultadosIntegração do enxerto

Dos 50 pacientes, a cirurgia foi bem‐sucedida em 39 (78%; fig. 3), entre os quais 22 (88%) pertenciam ao grupo A (espessura total) e 17 (68%) pertenciam ao grupo B (espessura parcial). Entre os 11 casos que apresentaram problemas na integração do enxerto, três (12%) eram do grupo A e oito (32%) do grupo B. Desses, todos os três pacientes do grupo A e três pacientes do grupo B apresentavam pequenas perfurações residuais na borda do enxerto de cartilagem (fig. 3), enquanto os outros cinco pacientes do Grupo B apresentaram medialização do enxerto ou uma grande perfuração residual. A taxa de integração do enxerto de cartilagem de espessura total foi significantemente melhor do que aquela observada nos enxertos de espessura parcial (p = 0,017; tabela 1). A taxa de integração permaneceu essencialmente igual do início ao fim do acompanhamento de um ano.

Figura 3.

Integração do enxerto tragal de espessura total bem‐sucedida e microperfurações residuais na borda de um enxerto tragal de espessura parcial.

(0,13MB).
Tabela 1.

Comparação da integração do enxerto entre enxerto de espessura total (A) e enxerto de espessura parcial (B)

Integração  GrupoTotal 
   
Falha11 
12,0%  32,0%  22,0% 
Bom22  17  39 
88,0%  68,0%  78,0% 
Total25  25  50 
100,0%  100,0%  100,0% 

p = ‐0,017 (Sig.).

O teste exato de Fisher foi usado para esse cálculo.

A tabela mostra a comparação da taxa de integração do enxerto em ambos os grupos. A taxa de integração dos enxertos de espessura total foi de 88% e a dos de espessura parcial foi de 68%, uma diferença estatisticamente significativa; a integração dos enxertos de espessura total foi melhor do que aquelas dos enxertos de espessura parcial.

Melhoria auditiva

A audição média pré‐operatória foi de 40,80 ± 7,46dB no grupo A e 39,40 ± 7,95dB no grupo B. Na avaliação pós‐operatória feita dois meses após a cirurgia, a média foi de 26,72 ± 8,08 no grupo A e 26,40 ± 8,60 no grupo B. Em ambos os grupos, a melhoria da audição foi muito semelhante e estatisticamente significante em comparação com a audição pré‐operatória (p = 0,012 para o grupo A e p = 0,018 para o grupo B; tabela 2). As figuras 4 e 5 apresentam os detalhes do status da audição em termos de diferencial aéreo‐ósseo. O ATP não foi repetido no acompanhamento de um ano, pois esses pacientes não notaram alteração significativa em seus níveis de audição em comparação com a avaliação da audição feita dois meses após a cirurgia.

Tabela 2.

Audição pré‐ e pós‐operatória em enxertos de espessura total e enxertos de espessura parcial

Audição (db)  Grupo  Média  DP 
Grupo APré‐operatório  25  40,80  7,46  0,012 (sig.)
Pós‐operatório  25  26,72  8,08 
Grupo BPré‐operatório  25  39,40  7,95  0,018 (sig.)
Pós‐operatório  25  26,40  8,60 

O teste U de Mann‐Whitney foi usado para esse cálculo.

A tabela indica que, em ambos os grupos, a melhoria da audição foi muito semelhante e estatisticamente significante em relação à audição pré‐operatória.

Figura 4.

Gráfico de barras mostra o diferencial aéreo‐ósseo (DAO) pré‐operatório nos dois grupos. ET, espessura total; EP, espessura parcial.

(0,06MB).
Figura 5.

Gráfico de barras mostra a melhoria no diferencial aéreo‐ósseo (DAO) pós‐operatório nos dois grupos. ET, espessura total; EP, espessura parcial.

(0,07MB).
DiscussãoSobre a cartilagem tragal

Devido à confiabilidade como material de enxerto e também ao uso crescente de endoscópio em cirurgias otológicas, observa‐se um aumento do uso de cartilagem nesses procedimentos. A cartilagem tragal é nutrida por difusão e, eventualmente, incorpora‐se à membrana timpânica.1 O enxerto é facilmente acessível e adequado; sua rigidez facilita a modelagem e manipulação, reduz a curva de aprendizado para timpanoplastia endoscópica. Nos pacientes do nosso estudo, foi usada uma incisão em forma de U invertido, seguido de descolamento de um retalho de pele sobre o trago. Ao contrário da incisão longitudinal rotineira usada para colher o enxerto, a técnica aqui descrita permite coletar cartilagem de formato circular e tamanho adequado com mais precisão.

Sugestões para single‐handed endoscopic ear surgery

O endoscópio de zero grau de 4mm permite uma visão panorâmica dos três principais elementos da timpanoplastia: o canal auditivo, a membrana timpânica e o ânulo timpânico.2

Todos os 50 casos do presente estudo foram operados com um endoscópio nasal de zero grau de 4mm. Na experiência dos autores, otoendoscópios mais curtos apresentam uma desvantagem, pois há aglomeração de mãos (já que ambas as mãos estão no mesmo plano horizontal); além disso, o menor diâmetro dificulta a visão. Além de seu uso em SHEES, o endoscópio de zero grau de 4mm pode ser usado em cirurgias nasais endoscópicas, é portanto rentável e apresenta um benefício monetário. Um campo incruento é essencial em SHEES. Ao levantar o retalho TM, foram usadas peças de merocel em vez das de algodão. Isso evita que as fibras de algodão permaneçam no ouvido médio ou no canal auditivo e afetem o resultado da cirurgia. Merocel também foi usado para envolver a parte externa do canal auditivo e manter o retalho cutâneo no lugar no fim da cirurgia. Deve‐se manter uma contagem exata das peças de merocel, pois essas não podem ser deixadas no campo cirúrgico. O embaçamento do endoscópio compromete a visão; isso pode ser reduzido se colocarmos um pequeno pedaço de esponja hemostática absorvível na abertura da tuba auditiva antes do início da cirurgia propriamente dita. A imersão frequente da ponta do osciloscópio em savlon também ajuda a desembaçar e reduz o calor gerado pelo endoscópio, especialmente quando uma fonte de luz xenon é usada.2

Instrumentação

Certos instrumentos endoscópicos específicos foram usados nos pacientes, como a microfoice e a faca redonda com peneira e uma sucção integrada (fig. 2). A microfoice e a micro‐flag knife permitem trabalhar as margens da perfuração e levantar o ânulo meticulosamente, mesmo em casos com canal estreito e projeção da parede do canal anterior. Esses instrumentos não obstruem a visão endoscópica e não são caros. O estilete redondo com peneira e sucção foi usado ao levantar o retalho TM. Embora o tubo de sucção ligado a esse instrumento causasse algum desconforto durante o uso inicial, os cirurgiões se acostumaram a ele após um certo período. Muitas variações desse instrumento estão disponíveis no mercado, mas os autores acreditam que é preciso selecionar o instrumento perfeito, que deve ter um reduzido espaço e angulação entre a ponta redonda e a ponta de sucção.

Outras técnicas podem ser usadas para tratar pacientes com um canal auditivo estreito, como a sutura de Tarabichi, que endireita o canal auditivo e aumenta o espaço de trabalho com o endoscópio. Também é possível usar um suporte de endoscópio se o uso de duas mãos for essencial para a cirurgia. No entanto, na experiência dos autores, as timpanoplastias de cartilagem simples podem ser eficientemente feitas com o uso dos instrumentos acima mencionados e a técnica de uma só mão.

Espessura total vs. espessura parcial

A taxa de integração do enxerto não é um problema com a cartilagem tragal; a única controvérsia que esse material apresenta é seu efeito na audição devido à sua espessura. Zahnert et al. (2000) examinaram a função de resposta de frequência das placas de cartilagem tragal com um interferômetro de Doppler a laser. Observaram‐se perdas de transmissão nas frequências mais baixas quando grandes defeitos da membrana timpânica foram reconstruídos com pedaços grossos de cartilagem. Esses autores concluíram que uma placa de cartilagem com espessura inferior a 0,5mm causava uma menor perda de transferência acústica.3

Atef et al. (2007) fizeram um estudo clínico prospectivo com enxerto em ilha de cartilagem‐pericôndrio, de espessura total ou parcial, em pacientes com perfuração central e cadeia ossicular intacta, alocados aleatoriamente em dois grupos. No primeiro grupo, 30 pacientes foram tratados com enxertos de espessura total, foi observada uma perfuração recorrente. No segundo grupo, 32 pacientes foram tratados com enxertos de meia espessura, foi observada uma perfuração recorrente. Os resultados anatômicos foram bons, com falha de 3% em ambos os grupos. A audição pós‐operatória foi igual nos dois grupos.4

Vadiya e Bhatt (2016) afirmaram que as taxas de integração do enxerto são excelentes tanto para a cartilagem tragal em espessura parcial quanto para a espessura total na técnica modificada de timpanoplastia com cartilagem. A diferença no ganho de audição não foi estatisticamente significativa entre os dois grupos, exceto em 4.000Hz. O ganho de audição em pacientes com enxertos de cartilagem tragal de espessura parcial foi maior do que o observado entre aqueles com enxertos de cartilagem tragal de espessura total.5

O presente estudo contradiz o trabalho de Zahnert et al. e está de acordo com o de Atef et al., demonstra melhoria auditiva semelhante, independentemente da espessura do enxerto de cartilagem tragal.

Os autores atribuem a maior taxa de microresíduos nas bordas do enxerto de cartilagem fatiado em pacientes pertencentes ao Grupo B à questão do “enrolamento”. Ao cortar o enxerto de cartilagem, o pericôndrio se contrai, faz com que as bordas do enxerto fiquem curvadas para o mesmo lado (fig. 6). Na experiência dos autores, o posicionamento desse enxerto é mais difícil do que o do enxerto de espessura total. A literatura praticamente não aborda o problema do enrolamento; Tos mencionou quatro incisões do pericôndrio, as “incisões antienrolamento”, que podem ajudar a resolver esse problema.6 Se o enxerto for colocado com o pericôndrio na superfície medial, a mucosa sobre o promontório não deve apresentar trauma, para evitar aderências no ouvido médio. Nos casos do grupo B, os autores optaram por colocar os enxertos de cartilagem fatiados com pericôndrio intacto no lado lateral.

Figura 6.

Enxerto de espessura total sem curvatura e enxerto de cartilagem tragal de espessura parcial com concavidade para o lado do pericôndrio.

(0,23MB).
Limitações do estudo

Vários estudos relataram taxas de implantação muito altas (ou mesmo de 100%) em timpanoplastias primárias com enxerto de cartilagem tragal. No presente estudo, a taxa geral de adesão foi de 78%; essa taxa mais baixa foi atribuída não apenas a fatores do paciente, como a baixa classe socioeconômica atendida por esse hospital, mas também à curva de aprendizado dessas técnicas. Como é um hospital terciário de ensino, nem todas as cirurgias foram feitas por um único cirurgião sênior; os autores acreditam que esse possa ter sido um fator relevante, ainda que a técnica e o protocolo do procedimento tenham sido essencialmente os mesmos. Visando a reduzir a curva de aprendizado da cirurgia endoscópica do ouvido, os autores estimulam os residentes a usar rotineiramente o endoscópio de zero grau de 4mm para exames diagnósticos da orelha. Quando os residentes demonstram uma boa coordenação olho‐mão, eles são treinados para fazer pequenos procedimentos.

Uma desvantagem potencial do enxerto tragal é a sua opacidade, pois pode ser mais difícil detectar um colesteatoma iatrogênico ou otite média secretora pós‐operatória. Duas das falhas observadas no presente estudo foram devidas a otite média secretora. Esses pacientes apresentavam traços de cola que saíam da perfuração residual na borda do enxerto de cartilagem. Por outro lado, a fáscia temporal não costuma ser completamente transparente no pós‐operatório.

Conclusão

SHEES com enxerto de cartilagem tragal é uma das melhores modalidades para o manejo de pacientes que necessitam de uma timpanoplastia simples tipo 1. É um procedimento minimamente invasivo, sem cicatrizes, com economia de tempo, custo‐benefício e alta conformidade do paciente.

Os presentes resultados indicam que a espessura da cartilagem tragal não afeta significantemente os resultados auditivos. A condição da orelha média, a seleção do paciente e a técnica cirúrgica, juntamente com o cuidado pós‐operatório, são responsáveis por um bom resultado, que também não é afetado pela espessura do enxerto.

Padrões éticos

Aprovação ética: Todos os procedimentos feitos neste estudo que envolveram participantes humanos atenderam aos padrões éticos do comitê de pesquisa institucional e da declaração de Helsinque de 1964 e suas posteriores alterações, ou padrões éticos comparáveis.

Consentimento esclarecido: Todos os pacientes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

Conflitos de interesse

Os autores declaram não haver conflitos de interesse.

Referências
[1]
R.M. Levinson.
Cartilage‐perichondrial composite graft tympanoplasty in the treatment of posterior marginal and attic retraction pockets.
Laryngoscope, 97 (1987), pp. 1069-1074
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M. Tarabichi.
Endoscopic transcanal middle ear surgery.
Indian J Otolaryngol Head Neck Surg, 62 (2010), pp. 6-24
[3]
T. Zahnert, K.B. Hüttenbrink, D. Mürbe, M. Bornitz.
Experimental investigations of the use of cartilage in tympanic membrane reconstruction.
Otol Neurotol, 21 (2000), pp. 322-328
[4]
A. Atef, N. Talaat, A. Fathi, M. Mosleh, S. Safwat.
Effect of the thickness of the cartilage disk on the hearing results after perichondrium/cartilage island flap tympanoplasty.
ORL J Otorhinolaryngol Relat Spec, 69 (2007), pp. 207-211
[5]
S. Vadiya, S. Bhatt.
Comparison of partial thickness and full thickness tragal cartilage graft during modified cartilage shield tympanoplasty for type I procedures.
Indian J Otolaryngol Head Neck Surg, 68 (2016), pp. 30-33
[6]
M. Tos.
Cartilage tympanoplasty: classification of methods‐techniques‐results.
1st ed., Thieme, (2009), pp. 353-364

Como citar este artigo: Parelkar K, Thorawade V, Marfatia H, Shere D. Endoscopic cartilage tympanoplasty: full thickness and partial thickness tragal graft. Braz J Otorhinolaryngol. 2020;86:308–14.

Nível de evidência para o estudo: Nível II

A revisão por pares é da responsabilidade da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico‐Facial.

Copyright © 2019. Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial
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