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Vol. 81. Núm. 4.
Páginas 345-346 (Julho 2015)
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Guidelines em otorrinolaringologia: uma visão crítica
Guidelines in otorhinolaryngology: a critical view
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Wytske Fokkensa, Vishal Pundira
a Departamento de Otorrinolaringologia, Academic Medical Centre, Amsterdã, Holanda
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Nas últimas duas décadas, evidências e revisões sistemáticas têm se constituído nos pilares da estruturação dos guidelines. Medicina baseada em evidências foi definida por Sacket et al. como “o uso consciencioso, explícito e criterioso das melhores evidências atuais na tomada de decisões pertinentes ao tratamento de cada um de nossos pacientes”.1 A prática da medicina baseada em evidências significa a integração da experiência clínica individual com as melhores evidências clínicas externas disponíveis por pesquisas sistemáticas. A abordagem GRADE (http://www.gradeworkinggroup.org) aponta para a importância de uma estimativa do efeito da intervenção e da confiança de que a estimativa seja correta; seus autores foram os primeiros a enfatizar o equilíbrio entre efeitos desejáveis e indesejáveis. Mais de 20 organizações, inclusive a Organização Mundial da Saúde (OMS), BMJ, e Cochrane Collaboration, adotaram o sistema GRADE. Na última década, o instrumento Appraisal of Guidelines for Research & Evaluation (AGREE) (http://www.agreetrust.org) foi desenvolvido com o objetivo de abordar sistematicamente a qualidade dos guidelines para a prática clínica.

Vários guidelines baseados em evidências tem sido elaborados, tanto a nível nacional como internacional, para aplicação na área da otorrinolaringologia.2-4 No entanto, ainda estamos muito longe da prática baseada em evidências em nosso cotidiano.5,6 Embora tenha sido demonstrado que a aderência aos guidelines melhora significativamente a qualidade de vida de nossos pacientes, também existe um vasto corpo de provas indicando que, com frequência, a aderência aos guidelines é desapontadora.7 Nesse editorial, tentamos avaliar as possíveis razões pelas quais não utilizamos os guidelines como deveríamos.

Um dos maiores problemas é que ainda não somos capazes de desenvolver guidelines a nível mundial, e podem ocorrer diferenças significativas nos guidelines sobre os mesmos tópicos, dependendo do país em que foi desenvolvido. Aarts et al. demonstraram que guidelines relativos a um tópico similar podem exibir diferenças no que tange a conclusões, níveis de evidência e citações utilizadas.8 Isso diminui a credibilidade dos guidelines. Embora estejamos cientes das diferenças nos sistemas de atendimento de saúde, seria importante que tivéssemos guidelines que fossem metodologicamente impecáveis e reconhecidos em todo o mundo; e que considerassem as possíveis diferenças regionais. Então, por hora o leitor, ao utilizar guidelines, precisa antes se certificar da sua qualidade. Nesse tocante, o instrumento AGREE constitui uma fonte de ajuda satisfatória.

Ademais, o leitor precisa ter em mente que, com frequência, as evidências nas quais os guidelines se baseiam não são esmagadoras, e que, em algumas situações, é muito difícil, ou mesmo impossível, obter um alto nível de evidência. Acredita-se que o número de estudos cirúrgicos randomizados permanecerá muito limitado. Quando há escassez e/ou limitada qualidade das evidências, frequentemente os autores dos guidelines tentam recomendar com base nas limitadas evidências disponíveis; mas em muitos casos as limitações de seus fundamentos não são levadas em conta na apresentação de elaborados esquemas diagnósticos ou terapêuticos. Com frequência, a situação oposta também é verdadeira – os guidelines fornecem respostas a uma longa lista de perguntas, sem, entretanto, orientação e assimilação; isso dificulta muito sua leitura e entendimento, comprometendo destarte seu emprego na prática cotidiana. Finalmente, quando tratamos nossos pacientes, é importante ter em mente que as evidências disponíveis podem ter sido acumuladas com base em um grupo populacional diferente daquele ao qual o nosso paciente pertence; frequentemente os estudos excluem pacientes com certas características, por exemplo, fumantes, crianças e pacientes com mais de 65 anos, ou mulheres grávidas.

Por ultimo, devemos ter em mente que a medicina é um campo em constante evolução. Os guidelines que seguimos atualmente são periodicamente atualizados à luz de novas evidências; assim, temos que nos certificar que estamos empregando as mais recentes recomendações e condutas em nossa prática diária.

Se o leitor interpretar esse editorial como um argumento contra o uso dos guidelines estará muito equivocado. Os guidelines constituem grande ajuda em nossa prática diária, proporcionando sustentação para todo profissional que não queira ou não tenha possibilidade de revisar toda a literatura disponível. Na maioria dos países, uma conduta deliberadamente diferente ou divergente das recomendações dos guidelines deve ser registrada no prontuário do paciente – e justificada por uma boa razão. Mas temos que evitar o uso dos guidelines para nossos pacientes como se fossem livros de receitas culinárias; tendo sempre bem presentes as ponderadas palavras de Sacket: A medicina baseada em evidências consiste no uso consciencioso, explícito e criterioso das melhores evidências atuais na tomada de decisões pertinentes ao tratamento de cada um dos nossos pacientes na sua individualidade.

Conflitos de interesse

Os autores declaram não haver conflitos de interesse.


DOI se refere ao artigo: http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2015.05.002

Como citar este artigo: Fokkens W, Pundir V. Guidelines in Otorhinolaryngology: a critical view. Braz J Otorhinolaryngol. 2015;81:345-6.

*Autor para correspondência.

E-mail:
wytskefokkens@gmail.com (W. Fokkens).

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Brazilian Journal of Otorhinolaryngology
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