South Africa has a high prevalence of co‐existing tuberculosis and HIV. As ototoxicity linked to the treatments for these conditions occurs with concomitant exposure to other ear toxins such as hazardous noise exposure, it is important to investigate the combination impact of these toxins. Limited published evidence exists on the co‐occurrence of these conditions within this population.
ObjectivesThe objective of this study was to compare the hearing function of gold miners with (treatment group) and without (non‐treatment group) the history of tuberculosis treatment, in order to determine which group had increased risk of noise induced hearing loss. Furthermore, possible influence of age and HIV in these two groups was examined.
MethodsA retrospective record review of 102 miners’ audiological records, divided into two groups, was conducted, with data analyzed both qualitatively and quantitatively.
ResultsFindings suggest that gold miners with a history of tuberculosis treatment have worse hearing thresholds in the high frequencies when compared to those without this history; with evidence of a noise induced hearing loss notch at 6000 Hz in both groups. Pearson's correlations showed values between 0 and 0.3 (0 and ‐0.3) which are indicative of a weak positive (negative) correlation between HIV and hearing loss, as well as between hearing loss and age in this population.
ConclusionsCurrent findings highlight the importance of strategic hearing conservation programs, including ototoxicity monitoring, and the possible use of oto‐protective/chemo‐protective agents in this population.
A África do Sul apresenta uma alta prevalência de coinfecção de tuberculose e HIV. Como a ototoxicidade associada aos tratamentos para essas condições é observada na exposição concomitante a outros agentes ototóxicos, como a exposição a ruídos perigosos, é importante investigar o impacto da combinação desses agentes. São poucas as evidências publicadas sobre a co‐ocorrência dessas condições nessa população.
ObjetivoComparar a função auditiva de garimpeiros com (grupo tratamento) e sem (grupo sem tratamento) história de tratamento de tuberculose, a fim de determinar que grupo apresentava maior risco de perda auditiva induzida por ruído. Além disso, avaliou‐se a possível influência da idade e do HIV nesses dois grupos.
MétodoOs registros audiológicos de 102 garimpeiros, divididos em dois grupos, foram revisados de forma retrospectiva; os dados foram qualitativa e quantitativamente analisados.
ResultadosOs achados indicam os garimpeiros com histórico de tratamento de tuberculose apresentam piores limiares auditivos nas altas frequências quando comparados àqueles sem esse histórico; em ambos os grupos, observou‐se perda auditiva induzida por ruído com entalhe audiométrico a 6.000Hz. As correlações de Pearson mostraram valores entre 0 e 0,3 (0 e ‐0,3), que são indicativos de uma fraca correlação positiva (negativa) entre o HIV e a perda auditiva, bem como entre a perda auditiva e a idade nessa população.
ConclusõesOs resultados atuais destacam a importância de programas estratégicos de conservação auditiva, inclusive monitoramento de ototoxicidade, e o possível uso de agentes oto‐/quimioprotetores nessa população.
Na África do Sul, a indústria de mineração de ouro apresenta vários desafios na área de saúde, inclusive a perda auditiva induzida por ruído (PAIR) ocupacional, bem como doenças pulmonares ocupacionais tais como a tuberculose (TB).1 Nessa indústria, preocupações de saúde como a PAIR se mantêm estáticas, mesmo com a tentativa de empregar técnicas para silenciar equipamentos.1 Além disso, tem‐se observado um drástico crescimento na incidência de TB na África do Sul, correlacionado com o aumento da prevalência do vírus da imunodeficiência humana (HIV).2 Embora TB e HIV sejam epidêmicas em todo sul do continente africano, o relatório da AngloGold Ashanti West Wits1 estimou que aproximadamente 85% de seus funcionários foram diagnosticados com TB e HIV. As implicações já descritas da coexistência dessas condições sobre a função auditiva, dentro de um ambiente de exposição crônica a ruído, devem ser investigadas e quantificadas, o que justifica a importância do presente estudo.
A indústria de mineração representa 8% do Produto Interno Bruto (PIB) da África do Sul, é uma das mais importantes do país.1,3,4 Apesar das oportunidades de emprego dentro da indústria de mineração de ouro, existem evidências suficientes para sustentar o fato de que existe um custo humano ligado a essa atividade. Estudos documentaram problemas de saúde entre garimpeiros, entre os quais diminuição da expectativa de vida, bem como aumento da prevalência de TB pulmonar ocupacional e PAIR.1,5–8
Em 2012, a AngloGold Ashanti relatou 446 novos casos de TB entre seus funcionários.1 Nesse relatório em particular, a empresa reconheceu que um aumento nas infecções por HIV/Aids apresenta uma interdependência com o aumento nos casos de TB no contexto sul‐africano. O impacto econômico da doença é um dos desafios.9 Karim et al.10 argumentam que a África do Sul está enfrentando a pior pandemia de HIV e TB do mundo; portanto, faz‐se necessária uma compreensão cuidadosa e clara do impacto do tratamento da TB na apresentação da PAIR no contexto sul‐africano.
A TB na indústria de mineração de ouro pode ser vista como uma das principais preocupações de saúde na África do Sul. Essa preocupação destaca a necessidade de determinar as funções auditivas dos garimpeiros com e sem histórico de tratamento da TB, motivo do presente estudo.
Os objetivos específicos dessa pesquisa foram:
- 1.
Descrever e comparar a função auditiva de um grupo de garimpeiros com histórico de tratamento de TB (grupo tratamento) com um grupo sem história de tratamento (grupo sem tratamento) – ambos os grupos apresentavam a mesma exposição ao ruído.
- 2.
Estabelecer o possível papel da idade e da infecção por HIV na função auditiva desses dois grupos de garimpeiros.
Este foi um estudo de revisão retrospectiva quantitativa transversal, usou dados obtidos em 102 prontuários médicos (204 ouvidos), comparou a função auditiva de garimpeiros expostos ao ruído com histórico de retratamento de TB e aqueles sem histórico de tratamento de TB, com o objetivo de definir qual grupo apresentava risco aumentado de PAIR. A amostragem intencional foi usada para selecionar os arquivos dos participantes que atendiam aos critérios de inclusão para o estudo. No entanto, como um dos objetivos do estudo foi tentar estabelecer o possível impacto que o histórico de tratamento de TB pode ter sobre a função auditiva em garimpeiros, foi crucial adotar um conjunto de critérios de inclusão dos participantes. Devido à escassez de pesquisas publicadas sobre PAIR ocupacional na África do Sul, a autora acreditava ser crucial avaliar variáveis que pudessem confundir os resultados do estudo (por exemplo, HIV e seus tratamentos, sífilis, exposição crônica ao mercúrio e tabagismo crônico, entre outros), o que justifica os critérios de inclusão adotados.
Cada grupo de garimpeiros foi composto por 51 arquivos de participantes (102 orelhas em cada grupo); os participantes foram pareados por idade, sexo e anos de exposição ao ruído ocupacional.
Os critérios de inclusão dos participantes foram:
História positiva/negativa de infecção por TB e histórico de r‐tratamento de TB para os grupos de tratamento e não tratamento, respectivamente. O grupo de tratamento incluiu apenas os audiogramas dos participantes após a fase de tratamento, pareados por anos de exposição e exposição ao ruído com os participantes do grupo sem tratamento.
A idade dos participantes variou entre 18 e 56 anos.
Registros de monitoramento audiológico seriado disponíveis.
Foram excluídos do estudo participantes com outras possíveis causas de perda auditiva, como doenças da orelha média, história de meningite, sífilis, uso de agentes quimioterápicos e exposição recreativa a ruídos, entre outros.
Protocolo de testeAntes do início do estudo, o Comitê de Ética em Pesquisa Médica Humana da Universidade autorizou o projeto de pesquisa (Protocolo n° M140331). Além disso, o estudo foi feito de acordo com os padrões éticos estabelecidos na Declaração de Helsinque da Associação Médica Mundial de 2012‐2013. As autoridades administrativas da mina autorizaram a feitura do estudo no local. Uma vez obtidas a permissão e aprovação pelo Conselho de Ética, a autora passou tempo no local da pesquisa, fez revisões detalhadas dos registros.
Análise de dados e procedimentos estatísticosPara garantir a confiabilidade da pesquisa, foram feitos controles referentes às variáveis, parâmetros referentes aos registros revisados e procedimentos de análise de dados empregados. Além de fazer avaliações de registros com um avaliador independente durante a análise de dados, um estudo‐piloto foi feito para garantir a confiabilidade e a validade da ferramenta de captura de dados.
Para analisar os dados, a média e o desvio‐padrão foram calculados para cada grupo. Os escores médios foram calculados para as variáveis idade, frequências de tom puro (TP) em cada orelha e perda percentual de audição (PPA). Em seguida, um teste t unicaudal para duas amostras foi usado para identificar a diferença no estado auditivo entre os dois grupos. Em seguida, um teste t unicaudal para duas amostras foi usado para determinar se o HIV teve impacto no estado auditivo. Por fim, as correlações de Pearson foram usadas para identificar possíveis relações entre idade e perda auditiva, bem como entre o HIV e a perda auditiva. Os coeficientes de correlação são expressos como valores entre+1 e ‐1, em que+1 indica uma correlação positiva perfeita, enquanto 0 indica nenhuma correlação. Valores entre 0 e 0,3 (0 e ‐0,3) indicam uma correlação positiva fraca (negativa); enquanto valores entre 0,3 e 0,7 (‐0,3 e ‐0,7) indicam uma correlação positiva (negativa) moderada. Valores entre 0,7 e 1 (‐0,7 e ‐1) indicam uma forte correlação positiva (negativa).
ResultadosA amostra (tabela 1) incluiu garimpeiros de uma mesma mina de ouro, com (grupo de tratamento) e sem (grupo sem tratamento) histórico de tratamento de TB. O estudo incluiu 102 prontuários médicos (204 orelhas). A idade dos participantes variou entre 41 e 48 anos (média: 43); o tempo médio de emprego na mina (tempo de exposição ao ruído) foi de 11,5 anos (intervalo: 5,6 a 13,4). No grupo tratamento, o tempo médio de revisões do audiograma após o tratamento da TB foi de 1,5 anos (intervalo: 9 meses a 1,4 ano). Todos os participantes do grupo tratamento apresentavam histórico de uso de estreptomicina, com registros de uso de aminoglicosídeos (capriomicina, amicacina ou canamicina). Entre os participantes no grupo tratamento, 76% também apresentaram HIV (em oposição a 9% no grupo sem tratamento); os dados do tratamento antirretroviral (TARV), de CD4+e carga viral foram documentados de forma inconsistente. Para aqueles em tratamento com TARV, o tratamento estava de acordo com as diretrizes desse tratamento em adultos.
Na análise dos limiares auditivos médios nos audiogramas (fig. 1), os resultados revelaram limiares auditivos abaixo de 25dB (dentro da faixa de audição normal) para todas as frequências testadas no grupo sem tratamento. Embora ainda dentro dos limites normais, um entalhe audiométrico bilateral a 6.000Hz foi encontrado no grupo sem tratamento. Embora uma queda tenha sido observada em ambos os grupos, em ambas as orelhas os limiares médios de TP foram piores no grupo tratamento do que no grupo sem tratamento. Os limiares auditivos no grupo tratamento foram piores do que 25dB nas frequências altas (4.000, 6.000 e 8.000Hz), nas quais os limiares foram piores do que 30dB HL. Esses achados indicam leve perda auditiva neurossensorial de alta frequência no grupo tratamento.
Os limiares nas faixas de frequências baixa e média (500, 1.000, 2.000 e 3.000Hz) foram melhores do que 25dB (dentro dos limites normais) em ambos os grupos.
Os resultados do teste t unicaudal para duas amostras, usado para determinar se houve uma diferença no estado da audição entre os dois grupos, indicaram que na maioria dos casos a hipótese H0 foi rejeitada, ou seja, observou‐se uma diferença estatisticamente significante na capacidade auditiva entre os dois grupos em todas as frequências testadas, exceto em 250Hz bilateralmente. Esse achado foi reproduzido em todas as frequências testadas bilateralmente (exceto 250Hz). Quando os escores das duas orelhas foram combinados, diferenças estatisticamente significantes foram encontradas em todas as frequências, exceto em 250Hz (o nível de significância adotado foi de 5%, indicou um nível de confiança de 95%).
Possível relação entre idade, HIV e perda auditivaOs resultados do teste t unicaudal para duas amostras, usado para verificar se o HIV teve um impacto sobre o estado auditivo na amostra atual, indicaram que a hipótese H0 não foi rejeitada em qualquer das frequências incluídas, o que indica que o HIV não teve impacto no estado auditivo dos garimpeiros nesta população.
As correlações de Pearson foram usadas para identificar possíveis associações entre idade e perda auditiva, bem como entre o HIV e a perda auditiva. Observaram‐se valores entre 0 e 0,3 (0 e ‐0,3), que são indicativos de uma fraca correlação positiva (negativa), como representado nas tabelas 2 e 3; isso indica que esses não foram fatores exacerbantes no estado auditivo da presente amostra.
Valores de correlação de Pearson para idade e perda auditiva
Valores de correlação para grupo sem tratamento – idade e perda auditiva | ||||||||||||||
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TP 500 | TP 1000 | TP 2000 | TP 3000 | TP 4000 | TP 6000 | TP 8000 | ||||||||
Direito | Esquerdo | Direito | Esquerdo | Direito | Esquerdo | Direito | Esquerdo | Direito | Esquerdo | Direito | Esquerdo | Direito | Esquerdo | |
d | ‐0,3 | ‐0,1 | 0,28 | ‐0,1 | 0,3 | 0,1 | 0,4 | 0,2 | 0,26 | 0,14 | 0,24 | 0,3 | 0,06 | 0,3 |
Valores de correlação para o grupo tratamento – idade e perda auditiva | ||||||||||||||
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TP 500 | TP 1000 | TP 2000 | TP 3000 | TP 4000 | TP 6000 | TP 8000 | ||||||||
Direito | Esquerdo | Direito | Esquerdo | Direito | Esquerdo | Direito | Esquerdo | Direito | Esquerdo | Direito | Esquerdo | Direito | Esquerdo | |
d | ‐0,3 | ‐0,2 | ‐0,06 | ‐0,14 | 0,2 | 0,1 | 0,13 | 0,1 | 0,3 | 0,24 | 0,3 | 0,14 | 0,08 | 0,14 |
Valores de correlação de Pearson – HIV
Participantes HIV‐positivos | ||||||||||||||
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TP 500 | TP 1000 | TP 2000 | TP 3000 | TP 4000 | TP 6000 | TP 8000 | ||||||||
Direito | Esquerdo | Direito | Esquerdo | Direito | Esquerdo | Direito | Esquerdo | Direito | Esquerdo | Direito | Esquerdo | Direito | Esquerdo | |
d | ‐0,2 | ‐0,1 | ‐0,02 | ‐0,2 | 0,1 | ‐0,14 | 0,12 | ‐0,03 | 0,3 | 0,2 | 0,1 | 0,1 | ‐0,12 | ‐0,14 |
Embora a legislação sul‐africana exija a implantação de programas de conservação auditiva nas minas, a prevalência de PAIR na indústria de mineração de ouro ainda é elevada. Portanto, é importante observar que as influências intrínsecas e ambientais podem se somar aos efeitos da exposição ao ruído ocupacional, como visto no presente estudo entre indivíduos com história de tratamento da TB.
Os presentes resultados indicam, primeiramente, que todos os garimpeiros de ouro expostos ao ruído no grupo sem tratamento apresentavam função auditiva dentro dos limites normais. No entanto, um claro entalhe audiométrico foi observado a 6.000Hz, em que o nível do limiar auditivo foi pior em ambos os grupos. Esse entalhe a 6kHz é consistente com a literatura, que documenta uma queda nessa frequência em casos de PAIR. De acordo com Humes, Joellenbeck e Durch,11 a exposição crônica ao ruído pode ser indicada por um entalhe audiométrico, geralmente a 3.000, 4.000 ou 6.000Hz. A variação da localização do entalhe audiométrico se deve simplesmente ao tipo de ruído ao qual os indivíduos estão expostos.12 A exposição excessiva ao ruído é considerada um risco global à saúde ocupacional; a literatura apresenta evidências suficientes da forte correlação entre ruído ocupacional e perda auditiva, que normalmente começa com esse entalhe audiométrico.
Embora esse entalhe tenha sido observado em ambos os grupos, a média do limiar de TP foi significantemente inferior no grupo tratamento do que no grupo sem tratamento. Essa é a primeira evidência na amostra atual que indica que os garimpeiros com histórico de tratamento de TB apresentam maior risco de PAIR, como indicado pelo pior entalhe audiométrico a 6.000Hz quando comparados ao grupo sem tratamento. Em segundo lugar, os achados do presente estudo demonstram claramente uma perda auditiva neurossensorial de alta frequência no grupo tratamento, que não foi observada no grupo sem tratamento. Essa é a segunda evidência que associa a TB à perda auditiva neste estudo. Como todas as condições e variáveis foram bastante similares em ambos os grupos (exceto a variável histórico de tratamento de TB), pode‐se argumentar que os achados atuais podem ser atribuídos à natureza da medicação ototóxica que faz parte do esquema de tratamento da TB. O uso medicamentos ototóxicos como a estreptomicina no tratamento da TB tem sido apontado como causador de perda auditiva em muitos indivíduos com certos fatores de risco. Esses fatores de risco incluem dosagem e a duração do tratamento de TB, nutrição, estado psicológico, idade e função renal, bem como o estado auditivo preexistente.13 A estreptomicina é um fármaco altamente ototóxico que pode afetar a cóclea pela deterioração das células ciliadas externas, afeta principalmente as frequências mais altas, como observado no presente estudo. Essa é outra confirmação da relação causal entre histórico de tratamento de TB e a perda auditiva no grupo tratamento.
Segundo Roland e Rutka,14 medicamentos ototóxicos, como aqueles usados no tratamento da TB, afetam o giro basal da cóclea, causam perda auditiva de alta frequência e/ou zumbido. Esses autores também afirmam que frequências baixas e médias também podem estar envolvidas, depende da duração da exposição à medicação ototóxica, e causar perda auditiva geral.14 Os resultados atuais são, portanto, consistentes com essa evidência.
Dalebout15 argumenta que, por razões teóricas e fisiopatológicas, a perda auditiva causada pela exposição ao ruído e/ou medicação ototóxica afeta ambas as orelhas igual e simetricamente; portanto, nenhuma diferença na função auditiva era esperada entre as orelhas direita e esquerda no presente estudo. No presente estudo, a hipótese H0 não foi rejeitada (não se observou diferença significativa na audição entre as orelhas direita e esquerda), o que corrobora a teoria de Dalebout sobre os efeitos simétricos desses agentes ototóxicos.15
O fato de que a evidência de PAIR (entalhe audiométrico a 6.000Hz) foi observada em ambos os grupos, embora com maior perda auditiva de alta frequência no grupo tratamento, parece confirmar a hipótese de que a exposição ao tratamento de TB piora a função auditiva nessa população exposta ao ruído. Esse achado confirma a evidência documentada de que tratamentos para TB têm um efeito direto na audição e que a exposição concomitante a medicamentos ototóxicos e ao ruído apresenta efeitos sinérgicos, compõe assim o sintoma auditivo observado.16
De acordo com Valente, Hosford‐Dunn e Roeser,17 o HIV causa perda auditiva neurossensorial em aproximadamente 49% dos pacientes infectados. Estudos locais18–23 indicaram uma ligação entre HIV/Aids e função auditiva em adultos e crianças, os vínculos causais são efeitos diretos, efeitos secundários (infecções oportunistas) ou ainda iatrogênicos (ototoxicidade dos tratamentos). Apesar da evidência de uma relação entre HIV/Aids e perda auditiva, os achados do presente estudo não indicaram impacto significativo do HIV sobre o estado auditivo dos participantes. Isso pode ser devido aos pequenos efeitos de tamanho amostral no presente estudo. A natureza retrospectiva da revisão do registro do estudo gera limitações nos dados obtidos, como dados de contagem de CD4+, carga viral e TARV; assim, não é possível tirar conclusões dos achados relativos à variável HIV. Estudos futuros podem contornar essa limitação.
A falta de correlação entre idade e perda auditiva em ambos os grupos não foi um achado surpreendente. No presente estudo, a idade média dos garimpeiros sem histórico de tratamento de TB foi de 40,2 anos e 45,4 anos entre aqueles com histórico de tratamento. A deterioração natural da audição com a idade passa a ser relevante por volta da quinta e sexta décadas de vida.24 Deve‐se notar que a audição individual pode variar e essa afirmação pode não ser verdadeira para todos os indivíduos. Em populações não expostas ao ruído, essa explicação para idade da presbiacusia é compreensível. No entanto, em casos de exposição ao ruído, os resultados atuais contradizem algumas evidências que sugerem uma interação idade‐ruído que exacerbaria a perda auditiva relacionada à idade.25 Por outro lado, os presentes resultados corroboram a ligação entre a perda auditiva e tratamento de TB.
ConclusãoOs achados atuais demonstram a necessidade de monitoramento da função auditiva em garimpeiros dessa população. Essa necessidade parece ser mais urgente em garimpeiros com histórico de tratamento de TB, já que esses indivíduos parecem apresentar pior audição do que aqueles do grupo sem tratamento. Além disso, o fato de o HIV aumentar a suscetibilidade individual à TB, como confirmado no presente estudo, em que 70% dos participantes com histórico de tratamento de TB apresentam coinfecção com HIV, gerará um aumento na demanda por serviços de audiologia na população de mineração exposta ao ruído na África do Sul que têm TB e são HIV positivo.
Os participantes deste estudo estão em uma faixa etária relativamente baixa; assim, a presbiacusia não foi um fator de confusão. O envelhecimento da população de garimpeiros, além da alta prevalência de TB e HIV nesse grupo, terá ainda mais implicações sobre a prestação de serviços clínicos audiológicos e otológicos para essa população. Os achados do presente estudo levantam implicações importantes para programas de conservação auditiva em garimpeiros com histórico de TB nesse contexto. A adesão ao uso de dispositivos de proteção auditiva pessoal dentro de um programa de monitoramento de ototoxicidade/ruído cuidadosamente executado, bem como o uso de agentes oto/quimioprotetores por garimpeiros que tomam medicamentos para TB, é consideração importante, especialmente quando se considera que o uso de dispositivos de proteção auditiva pessoal não pode ser garantido.
Conflitos de interesseA autora declara não haver conflitos de interesse.
A Carrie‐Anne Deeb, cuja monografia de graduação foi ampliada para este trabalho.
Como citar este artigo: Khoza‐Shangase K. Hearing function of gold miners with and without a history of tuberculosis treatment: a retrospective data review. Braz J Otorhinolaryngol. 2020;86:294–9.
A revisão por pares é da responsabilidade da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico‐Facial.