A paralisia unilateral de prega vocal pode ocorrer, na maioria dos casos, por causas traumáticas, inflamatórias, iatrogênicas, neoplásicas, neurológicas ou idiopáticas. A repercussão na voz, na deglutição e na qualidade de vida, assim como o risco de pneumonia, traz impactos negativos relevantes aos pacientes afetados por essa condição clínica.
Os tratamentos disponíveis para essa situação tratam de promover a coaptação glótica. São eles: fonoterapia da voz, medialização da prega vocal seja por injeção ou por tireoplastia (associada ou não a rotação de aritenoide) e reinervação. Esses tratamentos podem ainda ser classificados como temporários e definitivos.1
Considerando‐se as causas onde há lesão evidente da inervação motora da laringe, pouca dúvida resta no tratamento que promova a medialização, com ou sem reinervação, de forma definitiva. Entretanto naqueles pacientes em que existe a possibilidade de retorno à função há controvérsia sobre o que fazer e quando fazer.
As injeções laríngeas, chamadas também de laringoplastia por injeção, tornaram‐se mais populares na última década. Várias razões podem ser atribuídas a esse fenômeno, quais sejam: 1. materiais novos e seguros para injeção, 2. possibilidade de ser feita sob anestesia geral ou local e 3. diversas vias de abordagem – membrana cricotireoidea, incisura tireóidea, transcartilagem tireóidea e transoral. As evidências disponíveis através de uma metanálise não demonstram diferenças entre os resultados de qualidade de voz quando feitas sob anestesia geral ou local.2
Os materiais que podem ser usados, disponíveis em nosso meio, são a gordura autóloga, o ácido hialurônico e a hidroxiapatita. A gordura necessita ser retirada de uma área doadora, necessita de incisão. O ácido hialurônico será reabsorvido em cerca de 60 e 180 dias e a hidroxiapatita, se injetada na camada superficial da lâmina própria, pode prejudicar a vibração mucosa.
Nos últimos anos, publicações demonstram resultados promissores com a injeção imediata ou precoce (até 6 meses) de substâncias temporárias na tentativa evitar um tratamento cirúrgico definitivo (tireoplastia). Quatro coortes retrospectivas e prospectivas foram agrupadas em uma metanálise cujos resultados são significativos. A análise resultou em 275 pacientes agrupados e o risco relativo de não ser submetido a cirurgia foi de 0,25 (0,14‐0,45), com um intervalo de confiança de 95%. Dessa forma, a laringoplastia por injeção diminui a chance de necessidade de uma cirurgia definitiva em até 75%. Em outras palavras, a chance de um paciente ser submetido a tratamento cirúrgico definitivo no qual a injeção não é feita é de até 4 vezes maior. Há, evidentemente, limitações na metanálise em pauta. A principal é não haver um ensaio clínico randomizado para estudar o efeito da injeção laringoplástica quando comparada a observação e/ou fonoterapia da voz, pois os estudos são observacionais. Desse jeito, poderia ter havido viéses de seleção que favoreceram a hipótese em estudo. Da mesma forma, a análise da voz não foi um desfecho avaliado em todos os trabalhos, não se pode definir se os pacientes que eventualmente não foram submetidos a tireoplastia aceitaram viver com uma voz pior. Não há tampouco uma definição do timing ideal para a injeção – imediata (até 3 meses) ou precoce (3‐6 meses). De toda sorte, através dos resultados analisados, classifica‐se como grau de evidência C e permite‐se recomendar essa modalidade de tratamento para paralisias no estágio do conhecimento científico atual.
Não há uma explicação do mecanismo pelo qual a boa qualidade vocal e de deglutição se manteriam mesmo após a reabsorção do material injetado. Minha hipótese é que a reabsorção ocorre gradualmente, dia após dia, leva a uma adaptação lenta, gradual e consistente de todo o trato vocal a uma nova configuração glótica.
Em nosso meio, a estratégia da injeção imediata ou precoce em paralisia unilateral de prega vocal em pacientes no qual existe a possibilidade de retorno à função ainda não está popularizada. Isso, no meu entendimento, leva a uma espera desnecessária e sofrida por um tratamento definitivo. Não há justificativa para uma estratégia de observação (wait and see).2,3 Submete‐se os pacientes a um risco aumentado de complicações pulmonares, assim como às consequências vocais e deglutitórias cotidianas da insuficiência glótica.
Conflitos de interesseO autor declara não haver conflitos de interesse.
Como citar este artigo: Sant’Anna GD. Immediate and early injection in unilateral vocal fold paralysis. Braz J Otorhinolaryngol. 2020;86:1–2.