Deafness is the most frequent sensory deficit in humans. Incidence is estimated at 4:1000 births in Brazil. Specific programs for clinical care of patients with hearing loss are still scarce in Brazil and the issue is an important public health problem.
ObjectiveTo determine the frequency of 35delG and D13S1830 mutations in GJB2 and GJB6 genes respectively in patients with non‐syndromic sensorineural hearing loss from Minas Gerais, Brazil.
MethodsThis research involved 53 individuals, who were assessed by a questionnaire for predicting the possibility of non‐syndromic deafness and for data collecting. Samples were tested for the presence of the 35delG mutation in GJB2 gene and D13S1830 in GJB6 gene by polymerase chain reaction and restriction enzyme digestion.
ResultsEpidemiological research has shown that the majority of the subjects are unaware of the etiology and the pathogenesis of hearing loss. In 9 patients (16.98%), 35delG mutation was found in heterozygosis and the allele frequency was estimate to be around 8.5%. Although 9.61% of the patients reported having some degree of consanguinity between the parents and 12.08% reported other cases of deafness in their families, this mutation was not found in homozygosis. The D13S1830 mutation was not found in this study.
ConclusionThis research describes for the first time the frequency of the 35delG and D13S1830 mutation in hearing‐impaired individuals from Minas Gerais, Brazil, and the collected data reinforce the need for further studies in this population due to heterogeneity of hearing loss.
A surdez é o déficit sensorial mais frequente em humanos. Estima‐se que a incidência seja de 4:1.000 nascimentos no Brasil. Programas específicos para atendimento clínico de pacientes com perda auditiva são escassos no Brasil e a questão é um importante problema de saúde pública.
ObjetivoDeterminar a frequência das mutações 35delG no gene GJB2 e D13S1830 no GJB6 em pacientes deficientes auditivos de origem neurossensorial e não sindrômica de Minas Gerais, Brasil.
MétodoA pesquisa envolveu 53 indivíduos selecionados por meio de questionário o qual avaliou a possibilidade de surdez não sindrômica entre outros dados. As amostras foram testadas quanto à presença da mutação 35delG no gene GJB2 e D13S1830 no gene GJB6 por reação em cadeia da polimerase e digestão com enzima de restrição.
ResultadosA pesquisa epidemiológica mostrou que a maioria dos indivíduos desconhece a etiologia da perda auditiva. Em 9 pacientes (16,98%), a mutação 35delG foi encontrada em heterozigose e a frequência alélica foi estimada em 8,5%. Embora 9,61% das pessoas tenham relatado algum grau de consanguinidade entre os pais e 12,08% relatassem outros casos de surdez em suas famílias, essa mutação não foi encontrada em homozigose. A mutação D13S1830 não foi encontrada neste estudo.
ConclusãoEste trabalho descreve pela primeira vez a frequência da mutação 35delG e D13S1830 em deficientes auditivos de Minas Gerais, Brasil, e os dados coletados reforçam a necessidade de mais estudos nessa população devido à heterogeneidade da perda auditiva.
A surdez é o déficit sensorial mais frequente em humanos, com uma incidência que varia de 1:300 a 1:1.000 crianças. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a perda auditiva afeta cerca de 10% da população mundial.1 A frequência da surdez no Brasil é estimada em 4:1.000 nascimentos. No Brasil, fatores ambientais são responsáveis por 80% dos casos e as causas genéticas são responsáveis pelos outros 20%.2,3
As formas hereditárias não sindrômicas, que não estão associadas a outras manifestações clínicas, são responsáveis por cerca de 70% dos casos e podem ser autossômicas recessivas (DFNB), autossômicas dominantes (DFNA), ligadas ao X ou mitocondriais. As formas recessivas são mais prevalentes (75% a 80% dos casos) e tendem a ser mais graves e frequentemente associadas a alterações na cóclea, levam à incapacidade neurossensorial. As formas dominantes (15% a 20% dos casos) são mais leves e contribuem, na maioria dos casos, para a surdez pós‐lingual progressiva. As formas ligadas ao X são mais raras, assim como a forma mitocondrial.4–8 A identificação precoce da surdez com o diagnóstico etiológico também possibilita o tratamento precoce, melhora o prognóstico. No Brasil, os programas específicos para atendimento clínico de pacientes com perda auditiva ainda são escassos e isso constitui um importante problema de saúde pública. A pesquisa da surdez congênita não sindrômica com teste de Guthrie não está disponível no sistema público de saúde brasileiro (SUS, Sistema Único de Saúde) e apenas o teste de emissões otoacústicas (EOA) é exigido, por lei, nos recém‐nascidos.9 Além disso, o diagnóstico molecular é mais restrito em pesquisas científicas e a alta heterogeneidade genética da perda auditiva não sindrômica é um fator complicador.10
Mais de 150 loci foram mapeados e 93 genes foram identificados para perda auditiva não sindrômica,11 embora os genes envolvidos e as frequências das mutações sejam fortemente influenciados pela composição étnica da população.12 Descobriu‐se que mutações em três genes que codificam a conexina, GJB2 (Cx 26), GJB6 (Cx 30) e GJB3 (Cx 31), causam deficiência auditiva e a ocorrência nos dois primeiros é mais frequentemente descrita.2 Variações no gene GJB2 são responsáveis por até 50% de todos os casos de perda auditiva não sindrômica geneticamente causada em caucasianos.13 Não há relatos sobre a frequência das mutações nesses genes na população de surdos de Minas Gerais e aqui estimamos a frequência de duas mutações frequentemente descritas, 35delG no gene GJB2 e D13S1830 no gene GJB6 em pacientes com deficiência auditiva não aparentados do estado de Minas Gerais, Brasil.
MétodoAmostraFoi feito um estudo transversal, no qual 53 indivíduos com deficiência auditiva, 32 homens e 21 mulheres, todos não aparentados, foram estudados. Incluímos no estudo pacientes sem confirmação clínica sobre a causa da deficiência. Portanto, foram incluídos pacientes com deficiência auditiva classificada como de causa desconhecida, sem hipótese diagnóstica sobre a causa da perda auditiva, ausência de confirmação através de testes específicos e/ou confirmação médica descrita no relatório. Não houve restrição de idade para participação neste estudo. Todos os indivíduos são moradores da região Centro‐Oeste de Minas Gerais. Os pacientes foram recrutados da escola de assistência audiovisual para deficientes auditivos (AAVIDA) e da associação de surdos de Divinópolis, Minas Gerais, Brasil.
Este estudo foi aprovado pelo comitê de ética em pesquisa com seres humanos da Universidade Federal de São João del‐Rei, em Minas Gerais, com parecer favorável número 009/2011. Todos os passos para o esclarecimento do estudo foram feitos com a linguagem brasileira de sinais (Libras) e a língua portuguesa, para que todos os participantes tivessem plena autonomia para decidir sobre sua participação na pesquisa. Os indivíduos que decidiram participar do estudo assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido.
Usou‐se um questionário para coleta de dados relacionados à idade de início da perda auditiva, presença de outros casos na família, relações consanguíneas na família, manifestação de síndromes associadas à deficiência auditiva para confirmação de surdez não sindrômica e exclusão de causas ambientais com confirmação médica: infecções pré‐natais, como rubéola ou toxoplasmose, infecções pós‐natais e exposição a medicamentos ototóxicos.
Análise molecularAmostras de sangue (5mL) foram coletadas dos pacientes e o DNA genômico foi isolado de acordo com procedimentos padronizados.14 A amplificação da região genômica para análise da mutação 35delG no gene GJB2 foi feita com primers descritos anteriormente e a temperatura de annealing usada foi de 65°C.2 A PCR produz um fragmento de 89 pb que é digerido pela enzima de restrição BstNI. Indivíduos sem a mutação 35delG têm o sítio de restrição para a enzima BstNI e produzem dois fragmentos, de 69 pb e 20 pb. A deleção de 35delG elimina o sítio de restrição da enzima e, consequentemente, indivíduos homozigotos para essa mutação produzem apenas um fragmento de 89 pb, enquanto indivíduos heterozigotos produzem os três fragmentos descritos acima.2
A mutação D13S1830 no gene GJB6 foi detectada pela técnica padrão de PCR com três primers, F: (TTT AGG GCA TGA TTG GGG TGA TTT), R1: (CAC CAT GCG TAG CCT TAA CCA TTTT) e R2: (TCA TCG GGG GTG TCA ACA AACA).2 A temperatura de annealing foi de 62°C. Os primers R1 e R2 estão localizados no gene que codifica a proteína conexina 30 e o primer F está localizado antes da região de 342kb, a qual é deletada em indivíduos com a mutação. O primer reverso (R2), por sua vez, está localizado próximo ao ponto de quebra do DNA na presença da mutação. Indivíduos normais que não têm a mutação formarão produtos de 681 pb amplificados pelos primers R1 e R2. Quando a deleção ocorre, a região de annealing do primer R2 é perdida, aproxima‐se das regiões de anelamento dos primers F e R1, amplifica um fragmento de 460 pb. Portanto, os indivíduos heterozigotos têm fragmentos de 681 pb e 460 pb, enquanto os indivíduos homozigotos com a mutação apresentam apenas o fragmento com 460 pb. Duas mutações (35delG e D13S1830) foram rastreadas em todos os participantes.
Os produtos da PCR foram visualizados em gel de poliacrilamida a 8% corado com nitrato de prata. O produto de extração do DNA foi armazenado no freezer (temperatura média de ‐6°C) e de maneira similar aos produtos da PCR. Todas as análises foram feitas em um laboratório especializado em biologia molecular da Universidade Federal de São João del‐Rei, Divinópolis, MG, Brasil.
ResultadosNeste estudo, foram avaliados 53 indivíduos com deficiência auditiva. A idade dos pacientes variou de 5 a 42 anos, com média de 23,5.
Em relação ao estágio da perda auditiva, 32,07% dos indivíduos apresentaram manifestação ao nascimento, 26,41% perceberam a incapacidade auditiva antes dos dois anos e 11,32% após os dois anos. Essa informação não foi avaliada para 30,18% dos indivíduos. Entre os pacientes que responderam a perguntas sobre a etiologia da surdez, ninguém apresentou laudo médico que confirmasse a etiologia da perda auditiva. Pacientes com suspeitas sobre a possível causa de deficiência, mas sem confirmação médica, corresponderam a 60,37% da amostra; os dados não estavam disponíveis para 39,62%. O grande número de dados faltantes pode estar relacionado à falta de informação dos indivíduos sobre a provável causa da deficiência auditiva.
A linguagem brasileira de sinais (Libras) é uma forma de comunicação usada pela maioria dos participantes, 86,79%. Apenas 9,43% usam comunicação oral e os dados não foram avaliados para 3,77% da amostra.
Na análise de consanguinidade, 9,61% das pessoas relataram a existência de algum grau de consanguinidade entre os pais (confirmado apenas por genograma simples) e 12,08% relataram outros casos de surdez em suas famílias.
Em relação à análise molecular, indivíduos com surdez de etiologia desconhecida e residentes na região Centro‐Oeste do Estado de Minas Gerais, Brasil, foram investigados quanto à presença das mutações 35delG e D13S1830 nos genes GJB2 e GJB6, respectivamente. Dos 106 alelos presentes nos 53 indivíduos submetidos à análise molecular, nove apresentavam a mutação 35delG. Assim, a frequência alélica da mutação 35delG na amostra estudada foi de 8,5%. Todos os indivíduos com essa mutação eram heterozigotos (16,98%). Embora os pacientes relatassem a presença de relacionamentos consanguíneos em algumas famílias, os indivíduos homozigotos para essa mutação não foram encontrados. A mutação D13S1830 não foi encontrada nos indivíduos testados.
DiscussãoCasos de surdez pré‐lingual podem estar associados a fatores ambientais ou herança genética. Os fatores ambientais no Brasil estão entre as principais causas de perda auditiva, a síndrome da rubéola congênita e a anóxia neonatal são os fatores de risco associados mais prevalentes (33,5%), seguidos pelos de etiologia desconhecida (18,5%). Nos casos de surdez pós‐lingual, a perda pode ser uma consequência do uso de medicamentos ototóxicos, história familiar de perda auditiva, pode ser considerada idiopática em alguns casos.15
A mutação 35delG no gene GJB2 é a principal causa de surdez genética em populações caucasianas e foi descrita em todos os estudos feitos em outras regiões brasileiras.13,15,16 Essa mutação foi encontrada em heterozigose em 16,98% da amostra estudada. As formas recessivas da perda auditiva são as mais prevalentes nas formas hereditárias não sindrômicas. Quando os pacientes apresentam a mutação 35delG em ambos os alelos (homozigose), é possível afirmar que a deficiência auditiva se manifesta como resultado desse genótipo. No entanto, quando a mutação está em heterozigose, como na maioria dos casos, é necessário fazer análises adicionais no gene GJB2, para investigar uma possível heterozigose composta como justificativa da manifestação da surdez.
A frequência da mutação 35delG em uma amostra de deficiência auditiva do Estado de Minas Gerais foi descrita pela primeira vez neste estudo. Essa frequência é semelhante a outras já descritas em populações do Sudeste do Brasil (tabela 1). Os que não estão de acordo podem ser devido ao tamanho da amostra e aos critérios de seleção da amostra.2,8,17–19 Apesar de D13S1830 ser uma mutação frequentemente descrita em populações brasileiras, este alelo não foi encontrado na amostra de Minas Gerais. Alguns outros estudos também não encontraram essa mutação em sua análise.19–21 Embora as causas ambientais da surdez possam ser altamente frequentes no Brasil, a identificação das causas genéticas ocultas através dos testes moleculares é importante. O teste genético é útil para o diagnóstico precoce para atingir os objetivos na reabilitação de indivíduos surdos e aconselhamento genético. A pesquisa epidemiológica, como descrita aqui, mostrou que a maioria dos indivíduos desconhece a etiologia da surdez. Alguns deles suspeitam da causa, mas nenhum indivíduo tem um laudo médico, o que confirma a falta de dados quanto à etiologia e à patogenia da perda auditiva. Todos esses aspectos envolvidos na compreensão etiológica da surdez são importantes para proporcionar um melhor prognóstico; o estímulo da fala e a fraqueza da díade audição‐fala contribuem para uma melhor qualidade de vida para indivíduos com deficiência auditiva genética não sindrômica e suas famílias.17
Frequência da mutação 35delG em estudos anteriores feitos em populações brasileiras
Região | População amostral | Alelo 35delG | Referências |
---|---|---|---|
Estado de Minas Gerais | 53 pacientes com perda auditiva não sindrômica | 8,5% | Presente Estudo |
Estado de São Paulo | 300 pacientes com perda auditiva não sindrômica | 9,8% | 17 |
Estado de São Paulo | 180 pacientes com perda auditiva não sindrômica | 13,30% | 18 |
Estado de São Paulo | 33 pacientes com perda auditiva neurossensorial não sindrômica congênita | 21,21% | 8 |
Estado do Espirito Santo | 77 pacientes com perda auditiva não sindrômica | 7,8% | 2 |
Norte do Brasil | 77 pacientes com perda auditiva não sindrômica | 5,19% | 19 |
Embora variações no gene GJB2 causem quase que exclusivamente perda auditiva autossômica recessiva pré‐lingual, esse distúrbio é muito heterogêneo.13 Outras mutações, ou outros genes não estudados aqui podem estar envolvidos na patogênese da deficiência. O sequenciamento do gene GJB2 poderia ser útil para identificar o segundo alelo mutante e, apesar do sequenciamento do gene GJB6 não ter sido relatado em populações brasileiras até o momento, seria interessante identificar outras possíveis frequentes mutações associadas à deficiência auditiva.
ConclusãoEste trabalho descreve pela primeira vez a investigação molecular de dois genes relacionados à perda auditiva na população de Minas Gerais. A frequência alélica da mutação 35delG na amostra estudada foi de 8,5% e a mutação D13S1830 no gene GJB6 não foi encontrada nos pacientes investigados. Esses resultados, em conjunto, reforçam a necessidade de mais estudos sobre a investigação da surdez no Brasil, a fim de melhorar as questões de saúde pública e o aconselhamento genético. Informações genéticas e epidemiológicas possibilitam a identificação etiológica, aconselhamento genético para famílias e melhor avaliação da possibilidade de tratamento.
Conflitos de interesseOs autores declaram não haver conflitos de interesse.
Os autores agradecem a todos os pacientes por participarem deste estudo, à Escola de Assistência Audiovisual para Deficientes Auditivos (AAVIDA) e à Associação de Surdos de Divinópolis.
Como citar este artigo: Schüffner RO, Nascimento KL, Dias FA, Silva PH, Pires WG, Cipriano Junior NM, et al. Molecular study of hearing loss in Minas Gerais, Brazil. Braz J Otorhinolaryngol. 2020;86:327–31.
A revisão por pares é da responsabilidade da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico‐Facial.