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Vol. 88. Núm. 2.
Páginas 228-234 (Março - Abril 2022)
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Vol. 88. Núm. 2.
Páginas 228-234 (Março - Abril 2022)
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Morfologia craniofacial em pacientes com apneia obstrutiva do sono: avaliação cefalométrica
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Michele Tepedinoa, Gaetano Illuzzib, Michele Laurenziellob,
Autor para correspondência
michele.laurenziello@gmail.com

Autor para correspondência.
, Letizia Perilloc, Anna Maria Taurinob, Michele Cassanob, Laura Guidab, Giuseppe Burlonb, Domenico Ciavarellab
a University of L’Aquila, Department of Biotechnological and Applied Clinical Sciences, L’Aquila, Itália
b University of Foggia, Department of Clinical and Experimental Medicine, Foggia, Itália
c Second University of Naples, Multidisciplinary Department of Medical‐Surgical and Dental Specialties, Nápoles, Itália
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Estatísticas
Figuras (1)
Tabelas (4)
Tabela 1. Descrição das variáveis cefalométricas avaliadas
Tabela 2. Descrição dos índices registrados durante uma polissonografia noturna
Tabela 3. Estatística descritiva e teste de normalidade para variáveis cefalométricas e polissonográficas (n=84)
Tabela 4. Correlação rho de Spearman entre as variáveis craniofaciais e os índices polissonográficos (n=84)
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Resumo
Introdução

A apneia obstrutiva do sono é caracterizada por um fluxo de ar reduzido nas vias aéreas superiores durante o sono. Duas formas de apneia são descritas: a forma central e a forma obstrutiva. A forma obstrutiva tem sido relacionada a vários fatores, como a morfologia craniofacial.

Objetivo

Avaliar a correlação entre a morfologia da base do crânio, da mandíbula e da maxila e a gravidade da apneia obstrutiva do sono.

Método

Foram incluídos no presente estudo 84 pacientes com apneia obstrutiva do sono, com média de 50,4 anos; 73 homens e 11 mulheres. Pacientes com alto índice de massa corpórea e comorbidades foram excluídos. Foram coletados cefalogramas laterais e polissonografia para cada paciente para avaliar a correlação entre a morfologia craniofacial e a gravidade da apneia. Foi computado o coeficiente de correlação de postos de Spearman (rho) entre medidas cefalométricas e índices de apneia obstrutiva do sono. A significância estatística foi estabelecida em p <0,05.

Resultados

Pacientes com apneia obstrutiva do sono grave apresentaram redução do crescimento sagital do comprimento mandibular efetivo e do comprimento crânio‐basal. O comprimento mandibular foi a única variável que apresentou correlação estatística com o índice de apneia‐hipopneia. A dimensão vertical mostrou uma fraca correlação com a gravidade da apneia. Não foi demonstrada correlação com a dimensão maxilar sagital.

Conclusão

A gravidade da apneia obstrutiva do sono pode estar correlacionada ao crescimento da base mandibular e craniana. A dimensão facial vertical não apresentou correlação com a gravidade da apneia.

Palavras‐chave:
AOS
Via aérea
Polissonografia
IAH
SO2
Nadir
Texto Completo
Introdução

A apneia obstrutiva do sono (AOS) é caracterizada pela limitação da passagem de ar pelas vias aéreas superiores.1–3 Nos adultos, a AOS é mais prevalente em homens do que em mulheres, com uma frequência de 2:1. Tabagismo, obesidade, aumento da circunferência do pescoço, dimensão da língua e malformações craniofaciais são as condições comumente associadas à AOS.4,5 Em crianças, a AOS pode estar associada à hipertrofia adenotonsilar.6 A AOS está envolvida em muitas doenças ou distúrbios, tais como: doenças cardiovasculares,7 distúrbios metabólicos (por exemplo, diabetes),8 distúrbios gástricos (por exemplo, doença do refluxo gastroesofágico),9 distúrbios respiratórios (por exemplo, asma),10 distúrbios emocionais e psicológicos11 e aumento das taxas de mortalidade.12

A avaliação cardiorrespiratória e a polissonografia são as avaliações instrumentais usadas para o rastreamento e diagnóstico da AOS.13 Em casos particulares, os pacientes podem ser avaliados com a endoscopia com sono induzido por fármacos (DISE, Drug‐Induced Sleep Endoscopy).14 Esse tipo de avaliação pode auxiliar o clínico na seleção da modalidade de tratamento mais apropriada nos casos com diagnóstico de AOS.

A influência da morfologia craniofacial na patogênese da AOS é um argumento controverso.15 A avaliação cefalométrica foi usada na descrição do formato facial comum de pacientes com AOS.16 Descreveu‐se como a posição cervical, hioide e mandibular pode influenciar a gravidade da AOS.17

O objetivo do presente estudo foi avaliar se o comprimento e a posição vertical da base craniana anterior, do plano maxilar e mandibular estão correlacionados com os índices polissonográficos de gravidade da AOS. A hipótese nula foi a de que não existem correlações entre a morfologia craniofacial e a gravidade da AOS.

Método

Este estudo foi feito de acordo com as diretrizes da ferramenta Strengthening The Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE) para estudos observacionais.

Os prontuários dos pacientes encaminhados à seção de Ortodontia da Universidade de Foggia de janeiro de 2014 a setembro de 2018 e com diagnóstico de AOS foram selecionados conforme os seguintes critérios de inclusão: idade entre 30 e 60 anos, avaliação da sonolência diurna através do questionário Epworth sleepiness scale (ESS), não fumantes, índice de massa corpórea (IMC) menor do que 34kg/m2, sem tratamento cirúrgico maxilo‐facial ou de via aérea superior anterior, sem aparelho oral fixo ou reabilitação protética móvel, sem tratamento prévio com CPAP, sem doença da articulação temporomandibular, registros de diagnósticos, inclusive um cefalograma lateral.

O cálculo do tamanho da amostra (G*Power versão 3.1.9.2, Franz Faul, Universität Kiel, Alemanha) revelou que para ser capaz de detectar um tamanho de efeito médio de 0,318 com um erro do tipo I de 0,05 e uma potência de 0,85 seriam necessários 75 indivíduos.

Os procedimentos seguidos estavam em conformidade com a declaração de Helsinque de 1975, revisada em 2008, e foram aprovados pelo comitê de ética da Universidade de Foggia (Aprovação n° 43/CE/2019). Os prontuários foram recuperados retrospectivamente, analisados anonimamente e os pacientes assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido para participar de pesquisas futuras no momento em que os prontuários foram coletados.

Avaliação instrumental

Os traçados foram feitos em cefalogramas laterais por um operador cego para coletar as medidas mostradas na figura 1 e descritas na tabela 1, inclusive medidas lineares sagitais e medidas angulares verticais da base craniana anterior, do plano maxilar e da mandíbula. Para avaliar o erro do método, 20 cefalogramas foram selecionados aleatoriamente e os traçados foram repetidos 30 dias depois pelo mesmo examinador (M.T.). Um coeficiente de correlação intraclasse (CCI) foi calculado entre os dois conjuntos de medidas para avaliar a confiabilidade intraoperador.

Figura 1.

Traçado que mostra as variáveis cefalométricas usadas no presente estudo. S, ponto de sela; N, ponto de násio; ANS, espinha nasal anterior; PNS, espinha nasal posterior; Co, ponto de côndilo; Gn, ponto de gnático.

(0,04MB).
Tabela 1.

Descrição das variáveis cefalométricas avaliadas

Avaliação cefalométrica  Descrição 
N‐Ba (mm)  A distância entre o násio (parte anterior do osso nasal) e o básio (a parte póstero‐inferior do osso esfenoidal) 
Co‐GN (mm)  A distância entre o côndilo (parte superior do côndilo mandibular) e o gnático (a parte anterior da sínfise mandibular) 
ANS‐PNS (mm)  A distância entre a SNA (espinha nasal anterior) e a PNS (espinha nasal posterior) 
MXL‐BL°  O ângulo entre a MXL (linha maxilar) e a BL (linha de base craniana anterior) 
MXL‐Co‐Gn°  O ângulo entre a MXL (linha maxilar) e a linha CO‐GN (linha côndilo‐gnático) 
BL‐CoGn°  O ângulo entre a linha BL (linha de base craniana anterior) e a linha CO‐GN (linha côndilo‐gnático) 

Cada paciente foi submetido a uma polissonografia do tipo Split‐Night (SN‐PSG) e as três primeiras horas de sono foram usadas para determinação de um escore, como recomendado por vários autores.19–22 O registro foi considerado eficaz caso o dispositivo registrasse com sucesso mais de 4 horas sem interrupção. Os dados da gravação da SN‐PSG foram usados para compor um escore manual de acordo com os critérios da American Academy of Sleep Medicine (AASM) de 2007. Todos os indivíduos foram avaliados por uma noite em um laboratório do sono com um dispositivo portátil tipo 2, o sistema Embletta X‐100 (Flaga, Reykjavik, Islândia). A SN‐PSG incluiu eletroencefalograma (EEG), eletro‐oculograma (EOG), eletromiograma (EMG), canal de oximetria de pulso, cânula nasal, cinta de esforço respiratório torácico e abdominal e sensores de posição corporal. O fluxo de ar foi monitorado por cânula nasal e por termistor oral. Os movimentos torácico‐abdominais de todos os indivíduos foram detectados através de duas cintas piezoelétricas. Registros contínuos da saturação de oxigênio durante a noite foram obtidos por oximetria de pulso digital. O ronco foi registrado por um microfone colocado no pescoço e os achados do ECG e a posição do corpo ao dormir foram anotados. A gravação foi feita após uma noite de adaptação ao ambiente hospitalar.

Os dados extraídos das gravações da SN‐PSG estão descritos em detalhes na tabela 2.

Tabela 2.

Descrição dos índices registrados durante uma polissonografia noturna

Avaliação polissonográfica  Descrição 
IAH  Índice de apneia‐hipopneia: o número de eventos de apneia e hipopneia por hora de sono. 
SO2  Fração de hemoglobina saturada de oxigênio em relação à hemoglobina total (insaturada + saturada) no sangue. 
NADIR  O menor valor de saturação de oxigênio no sangue registrado durante a noite. 
Análise estatística

Os dados foram analisados com o software GraphPad Prism 6.0 (GraphPad Prism Software, San Diego, CA, EUA). A estatística descritiva foi calculada e a distribuição dos dados foi avaliada por um teste de Kolmogorov‐Smirnov e gráficos de probabilidade. Para avaliar a correlação entre os dados da SN‐PSG e as medidas craniofaciais, foi usado um coeficiente de correlação de Pearson ou uma correlação rho de Spearman, dependeu da distribuição dos dados. O erro do tipo I foi definido como p <0,05.

Resultados

Foram incluídos no estudo 84 pacientes (média de 50,4 anos; 73 homens e 11 mulheres) com AOS.

Em relação ao erro do método, o CCI calculado foi excelente (> 0,85) para todas as variáveis, revelaou uma boa confiabilidade intraobservador das medidas.

A estatística descritiva das medidas craniofaciais e dos índices de SN‐PSG está descrita na tabela 3. As variáveis IAH, comprimento da base do crânio (N‐BA) e comprimento mandibular (Co‐Gn) apresentaram um grande desvio‐padrão (N‐BA: DP=13,44mm; Co‐Gn: DP=27,17mm; IAH: DP=20,21mm).

Tabela 3.

Estatística descritiva e teste de normalidade para variáveis cefalométricas e polissonográficas (n=84)

  Média  DP  EP  Teste de normalidade 
N‐BA (mm)  122,3  13,4  1,5  N,S, 
Co‐Gn (mm)  145,4  27,2  2,9  N,S, 
SNA‐SNP (mm)  61,59  6,6  0,7  < 0,05 
MXL‐BL°  24,93  5,6  0,6  < 0,05 
MXL‐Co‐Gn°  49,85  5,3  0,6  N,S, 
BL‐Co‐Gn°  74,78  6,4  0,7  < 0,05 
IAH  37,02  20,2  2,2  <0,05 
SaO2  93,12  2,9  0,3  N,S, 
Nadir SaO2  77,48  10,4  1,1  N,S, 

Como a maioria das variáveis não mostrou estar normalmente distribuída, foi usado um teste estatístico não paramétrico. O teste rho de Spearman (tabela 4) detectou uma correlação negativa significativa entre o IAH e o comprimento Co‐Gn (p <0,001; ρ=‐0,37) e entre o IAH e o N‐Ba (p <0,05; ρ=‐0,25). O comprimento maxilar (ANS_PNS) mostrou uma correlação negativa com o Nadir (p <0,01; ρ=‐0,30) e uma correlação positiva forte e significante com o N‐BA (p <0,001; ρ=0,58) e Co‐Gn (p <0,001; ρ=0,47).

Tabela 4.

Correlação rho de Spearman entre as variáveis craniofaciais e os índices polissonográficos (n=84)

  N‐BA (mm)  Co‐Gn (mm)  SNA‐SNP (mm)  MXL‐BL°  MXL‐Co‐Gn°  BL‐Co‐Gn°  IAH  SaO2  Nadir SaO2 
N‐BA (mm)  −  0,701b (<0,001)  0,581b (<0,001)  ‐0,029 (0,792)  ‐0,162 (0,142)  ‐0,071 (0,522)  ‐0,254a (0,020)  0,027 (0,806)  0,129 (0,242) 
Co‐Gn (mm)  0,701b (<0,001)  −  0,475b (<0,001)  ‐0,387b (<0,001)  ‐0,076 (0,493)  ‐0,355b (<0,001)  ‐0,371b (<0,001)  0,191 (0,082)  0,069 (0,533) 
SNA‐SNP (mm)  0,581b (<0,001)  0,475b (<0,001)  −  ‐0,378b (<0,001)  ‐0,164 (0,136)  ‐0,395b (<0,001)  ‐0,107 (0,334)  0,004 (0,967)  0,127 (0,249) 
MXL‐BL°  ‐0,029 (0,792)  ‐0,387b (<0,001)  ‐0,378b (<0,001)  −  ‐0,309b (0,004)  0,554b (<0,001)  0,110 (0,318)  ‐0,171 (0,120)  ‐0,064 (0,560) 
MXL‐Co‐Gn°  ‐0,162 (0,142)  ‐0,076 (0,493)  ‐0,164 (0,136)  ‐0,309b (0,004)  −  0,574b (<0,001)  0,163 (0,138)  ‐0,056 (0,613)  ‐0,080 (0,469) 
BL‐Co‐Gn°  ‐0,071 (0,522)  ‐0,355b (<0,001)  ‐0,395b (<0,001)  0,554b (<0,001)  0,574b (<0,001)  −  0,234a (0,032)  ‐0,246a (0,024)  ‐0,030 (0,784) 
IAH  ‐0,254a (0,020)  ‐0,371b (<0,001)  ‐0,107 (0,334)  0,110 (0,318)  0,163 (0,138)  0,234a (0,032)  −  ‐0,470b (<0,001)  ‐0,571b (<0,001) 
SaO2  0,027 (0,806)  0,191 (0,082)  0,004 (0,967)  ‐0,171 (0,120)  ‐0,056 (0,613)  ‐0,246a (0,024)  ‐0,470b (<0,001)  −  0,205 (0,061) 
Nadir SaO2  0,129 (0,242)  0,069 (0,533)  0,127 (0,249)  ‐0,171 (0,120)  ‐0,080 (0,469)  ‐0,030 (0,784)  ‐0,571b (<0,001)  0,205 (0,061)  − 
a

Estatisticamente significante com p <0,05.

b

Estatisticamente significante com p <0,01.

O padrão de divergência craniofacial dos pacientes com AOS foi descrito pelas variáveis angulares MXL‐BL, MXL‐CoGn e BL‐CoGn, que apresentaram dispersão de dados semelhante (MXL‐BL°: DP=5,6; MXL‐CoGn°: SD=6,4 Bl‐CoGn°: DP=6,4).

O teste rho de Spearman demonstrou uma correlação positiva entre a quantidade de rotação mandibular e a gravidade do IAH (p <0,05, ρ=0,23). O BL‐CoGn° foi positivamente correlacionado ao SO2 (p <0,05; ρ=‐0,24). Não foi encontrada correlação entre a rotação maxilar e todos os dados da SN‐PSG (tabela 4).

Discussão

Foi estudada a relação entre a gravidade da AOS e a dimensão linear ou rotação vertical das principais estruturas craniofaciais relacionadas à forma obstrutiva da AOS (isto é, a base craniana anterior, a mandíbula e a maxila).

A pesquisa de preditores cefalométricos em pacientes com AOS é um dos tópicos mais importantes na medicina do sono,23,24 bem como a pesquisa de fatores preditivos precoces – como a morfologia craniofacial – em crianças, que podem estar associadas à patogênese da AOS.25

A obstrução das vias aéreas superiores pode estar relacionada ao colapso de estruturas de tecidos moles, como o palato mole,26 à posição e/ou dimensão da língua27 ou à posição e/ou dimensão alterada da maxila ou da mandíbula.28–30

A avaliação dos tecidos moles craniofaciais é outro aspecto importante.31 Muitos autores avaliaram pacientes com AOS com avaliação fotográfica ou escaneamento 3D da superfície da face.32,33 Lee et al.32 sugeriram que os pacientes com AOS apresentavam o terço médio e o terço inferior da face mais largo e mais plano. Além disso, os autores mostraram uma redução do comprimento maxilar e mandibular. Tyan et al. mostraram uma correlação significante entre as medidas craniofaciais (ou seja, razão do contorno cervicomental, relação face‐largura, ângulo do trago‐ramo‐estômio) e IAH em pacientes com AOS.31 Liu et al. descreveram os parâmetros craniofaciais e cefalométricos observados em pacientes com AOS e sua influência no tratamento da AOS com dispositivos de avanço mandibular.34 Os autores sugeriram dois tipos de formato craniofacial e de tecidos moles de pacientes com AOS: indivíduos com avanço maxilar, orofaringe pequena, molares superiores menos irrompidos, pequeno overjet de incisivo e palato mole pequeno e pacientes com retração de maxila, orofaringe maior, palato mole maior e molares superiores mais irrompidos. O primeiro grupo de pacientes apresentou AOS relacionada à posição dos tecidos duros; o segundo grupo apresentou AOS relacionada a um aumento do volume de tecidos moles secundário a um aumento do IMC.

No presente estudo, apenas pacientes com IMC normal foram avaliados para evitar a influência de um possível fator de confusão, uma vez que a relação entre AOS e variação do IMC está bem descrita na literatura.35

Muitos estudos avaliaram a posição crânio‐cervical como um possível fator na patogênese da AOS.36 A variação da posição da cabeça e das vértebras cervicais pode alterar o espaço faríngeo37 e muitos autores relataram que a postura da cabeça mostrou diferenças significantes nos pacientes com AOS em comparação aos controles; de fato, um aumento dos ângulos crânio‐cervicais induziu uma posição natural estendida da cabeça que reduz a obstrução das vias aéreas.

No presente estudo, foram avaliadas as principais estruturas craniofaciais que definem o perímetro nasal e oral da faringe: comprimento da base do crânio (N‐Ba), comprimento mandibular efetivo (Co‐Gn), comprimento maxilar (ANS‐PNS) e a rotação vertical de tais estruturas.

Os resultados do presente estudo mostraram uma correlação negativa significativa entre o comprimento total mandibular (medido do topo do côndilo à parte inferior‐anterior da mandíbula) e o IAH (ρ=‐0,37; p <0,001). O comprimento da base do crânio mostrou uma fraca correlação negativa com o IAH (ρ=‐0,25; p <0,05), mas mostrou uma correlação forte e altamente significante com o comprimento da mandíbula (ρ=0,70; p <0,0001). Parece que o crescimento mandibular pode influenciar a gravidade da AOS e que o crescimento e/ou a posição da mandíbula é influenciado pelo comprimento da base craniana. Há relatos contraditórios na literatura sobre a influência do crescimento da base craniana e o desenvolvimento de má oclusão e, mais especificamente, o crescimento da mandíbula. Uma revisão sistemática apresentou a possibilidade de tal associação e os resultados do presente estudo parecem confirmar essa observação.38 Esse achado é significativo porque a avaliação cefalométrica da base do crânio, como para um diagnóstico ortodôntico, poderia ser usada para avaliar o crescimento mandibular previsível e o consequente risco de desenvolvimento da AOS.

O comprimento maxilar não se correlacionou com os parâmetros da SN‐PSG, mas apresentou correlação significativa com o comprimento da base craniana e o comprimento da mandíbula (tabela 4).

Em relação à rotação vertical das estruturas craniofaciais, três parâmetros foram avaliados: a rotação vertical do terço médio da face (MXL‐BL°, a rotação do plano maxilar em relação à base craniana), a rotação vertical da terço inferior da face (MXL‐Co‐Gn°, rotação da mandíbula em relação ao plano maxilar) e a rotação vertical geral do crânio (BL‐Co‐Gn, rotação da mandíbula em relação à base craniana).

A rotação vertical do terço médio e a rotação vertical do terço inferior não apresentaram correlação com os índices da SN‐PSG. A rotação vertical total do crânio mostrou uma fraca correlação positiva com o IAH (ρ=0,23; p <0,05) e uma fraca correlação negativa com o SO2 (ρ=‐0,24; p <0,05). Além disso, a rotação vertical craniana mostrou uma correlação negativa significante com o comprimento mandibular efetivo (ρ=‐0,35; p <0,0001) e foi altamente correlacionada com a rotação vertical do terço médio (ρ=0,55; p <0,0001) e a rotação vertical do terço inferior (ρ=0,57; p <0,0001). Com relação às limitações do presente estudo, o desenho retrospectivo e o uso de imagens bidimensionais devem ser enfatizados. Entretanto, tomou‐se o cuidado de evitar qualquer viés de seleção com o uso de uma ordem cronológica rígida durante a obtenção da amostra e o cegamento do operador que fez os traçados. Além disso, mesmo que as radiografias tridimensionais ofereçam um número maior de informações, os resultados do presente estudo ainda apresentam uma maior generalização porque os cefalogramas laterais ainda são o tipo de exame radiográfico mais usado na prática ortodôntica cotidiana.

Conclusão

De acordo com os resultados do presente estudo, as formas obstrutivas da AOS podem estar relacionadas à relação posicional alterada entre as estruturas craniofaciais. Em particular, pode‐se concluir que um comprimento mandibular reduzido Co‐Gn pode influenciar a gravidade da AOS; o comprimento mandibular está altamente correlacionado com o comprimento sagital da base do crânio; o aumento da rotação vertical de todo o complexo craniofacial mostrou uma fraca correlação com o valor do IAH.

Conflitos de interesse

Os autores declaram não haver conflitos de interesse.

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Como citar este artigo: Tepedino M, Illuzzi G, Laurenziello M, Perillo L, Taurino AM, Cassano M, et al. Craniofacial morphology in patients with obstructive sleep apnea: cephalometric evaluation. Braz J Otorhinolaryngol. 2022;88:228–34.

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