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Vol. 81. Núm. 4.
Páginas 343-344 (Julho 2015)
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Produção científica brasileira vs. inovação e tecnologia
Brazilian scientific production vs. innovation and technology
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Paulo Pontesa
a Departamento de Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço, Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), São Paulo, SP, Brasil
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A afirmação de que a produção científica brasileira é uma  das que mais cresce no mundo ganha sustentação ao analisarmos os dados publicados pelas diversas plataformas. De  2001 a 2011, o Brasil, no cenário mundial, subiu do 13º para  o 7º lugar em quantidade de artigos publicados. Este fato  seria motivo de orgulho para nós; porém, se analisarmos a  qualidade desses artigos e as suas transformaç es em inovaç es e tecnologia, teremos um sentimento oposto.

Consideremos inicialmente a qualidade. Segundo artigo  recente da revista “Nature”, as publicaç es brasileiras representam apenas 1% das que são selecionadas pelos periódicos  de maior credibilidade. Como explicar essa discrepância? Ela reside no aumento do número de periódicos brasileiros que  passaram a integrar as bases de dados, que subiu de 62 para  270. Em outras palavras, o aumento não se deu em decorrência da maior aceitação dos nossos artigos nas revistas de  maior impacto, mas ganhamos posiç es correndo por atalhos!

E quanto à inovação? A inovação a partir dos estudos científicos possui apenas um critério a ser medido: o número de  patentes deles resultantes. O Brasil é um dos países que  menos registram patentes, e a sua participação no mercado  mundial não passa de 0,2%, segundo o Tratado de Cooperação  de Patente, 2011. Com estes 0,2%, deveríamos nos orgulhar  das instituiç es brasileiras? Outra surpresa: nas áreas mais  avançadas da tecnologia, as patentes de instituiç es estrangeiras representaram 90% do total! Este fato é alarmante, e  a razão de toda essa discrepância está no fato de a maioria  de nossos pesquisadores pertencer às universidades públicas.

Em levantamento feito em 2009 (UFPE), dos 85 mil doutores existentes, apenas 2% estavam nas empresas, e lembro  ainda que, somente em 2010, formaram-se 12 mil doutores,  produção equivalente a países campe es em inovação. A conclusão que podemos tirar desse paradoxo é que, nas universidades brasileiras, os pesquisadores são pressionados a publicar mais, independentemente da qualidade. Isso significa que acima do interesse de se produzir inovação para o  progresso do país está o interesse na carreira docente em  disputas intestinas e o desejo de melhor qualificação da universidade para receber mais recursos dos órgãos de fomento.

É essencial que as universidades públicas, custeadas pela  população, derrubem as barreiras ideológicas e se voltem  para o setor privado, dentro do que hoje, universalmente,  é conhecido como “inovação aberta”, na qual a parceria entre universidades e empresas estabelecem entre si metas e  estratégias comuns e seguras, sem as intermediaç es políticas  que levam à corrupção. Dessa forma, os benefícios reverteriam à sociedade: as universidades contribuem com os pesquisadores e as empresas com recursos, logística e distribuição  dos produtos, com retorno econômico ético para todos e com  grandes lucros sociais.

Assim, aqui no Brasil, as indústrias que só vendem tecnologias importadas passariam a produzi-las, e as universidades  deixariam de ter produção para consumo próprio. Há a necessidade de se juntar os parceiros. Em Medicina introduziuse o estímulo por melhor proteção à saúde, mas não se  pensou nos produtos, a maioria importados. Em 2012 foi exportado, segundo dados oficiais, 1,5 bilhão de reais em medicamentos, e importados 7,4 bilh es! A política de Estado  deve ser também a de associar a pesquisa ao mercado, mas  estamos longe disso. O regime jurídico-administrativo das  nossas universidades inviabiliza esta prática; é preciso dar às  universidades públicas brasileiras o direito de livre associação a empresas ou instituiç es privadas para inovação e tecnologia, com autonomia para captar, direcionar e gerenciar  recursos, tanto humanos quanto financeiros.

Dessa forma, um maior número de invenç es seria produzido no Brasil, gerando patentes. Os pesquisadores estão  majoritariamente nas universidades e fazem parte dos sistemas de bolsas, que conta como relevante a publicação de  papers; sempre que um paper é publicado, perde-se a novidade, condição essencial para a patente, e a inovação  torna-se de domínio público. Assim, o país que financiou a pesquisa não tem o merecido retorno. Nesse mesmo sentido, em razão de as universidades públicas serem empresas  públicas, com direito a estabilidade de seus funcionários,  sejam docentes ou administrativos, e a progressão na carreira se dar por tempo de serviço, perde-se o interesse pela  produção científica. Assim, as decis es dos colegiados maiores, dominados por representantes dos interesses corporativistas, exaurem os recursos que deveriam ser direcionados  a pesquisa, ensino e extensão, razão da existência das universidades.

Qual o papel da nossa “Brazilian Journal of Otorhinolaryngology” neste panorama? A área de estudo que mais cresceu  no Brasil foi a da Medicina e, nesta, a pesquisa clínica, que  é de inestimável valor à prática médica e cujo maior beneficiário é a sociedade. Até aqui, a nossa Revista vem cumprindo a sua missão em escala ascendente admirável, com  rigorosa seleção científica, mas chegou o momento de incluir nos seus critérios de seleção os trabalhos com potencial ou real benefício para inovação, que trarão ao Brasil a  contribuição para o seu destino de nação evoluída e independente.

Conflitos de interesse

O autor declara não haver conflitos de interesse.


DOI se refere ao artigo: http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2015.05.001

Como citar este artigo. Pontes P. Brazilian scientific production vs. innovation and technology. Braz J Otorhinolaryngol. 2015;81:343-4.

E-mail: ppontes@inlar.com.br (P. Pontes).

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Brazilian Journal of Otorhinolaryngology
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