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Vol. 86. Núm. S1.
Páginas 20-22 (Dezembro 2020)
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Relato de caso
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Soft palate fistula after radiofrequency ablation for primary snoring: a case report and literature review
Fístula do palato mole após ablação por radiofrequência para o tratamento de ronco primário: relato de caso e revisão de literatura
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Lauren K. Reckley, Camilo Fernandez‐Salvador, Edward T. Chang, Macario Camacho
Autor para correspondência
drcamachoent@yahoo.com

Autor para correspondência.
Tripler Army Medical Center, Division of Otolaryngology‐Head and Neck Surgery, Honolulu, Estados Unidos
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Introdução

Ronco é uma queixa comum em pacientes que procuram cuidados médicos. O ronco pode perturbar o sono dos parceiros de cama ou daqueles que compartilham um quarto com um roncador. Embora aplicativos de smartphone para ronco tenham sido usados para determinar a intensidade e o número de roncos por hora,1 o parceiro de cama é, em última análise, o principal determinante do que é e não é um ronco perturbador. O ronco é geralmente causado pela vibração do palato mole contra as paredes faríngeas. Embora o ronco possa ocorrer exclusivamente durante a respiração nasal,2 ocorre mais comumente durante a respiração oral. Várias técnicas foram desenvolvidas para tratar o ronco, tais como a injeção roncoplástica, implantes de pilar, cirurgia de endurecimento palatino com cautério (CAPSO) e ablação por radiofrequência (ARF). A ablação por radiofrequência tem sido efetivamente usada em várias especialidades cirúrgicas. O mecanismo de ação da ARF é relacionado à temperatura não muito alta, à corrente de alta frequência, causa inflamação local e, consequentemente, fibrose e rigidez do tecido.3 A ARF do palato mole é minimamente invasiva, com poucas complicações, e visa ao enrijecimento do palato mole. As complicações da ARF incluem: ulceração da mucosa, descamação, aparecimento de crostas na mucosa, hemorragia, lesão nervosa e fístula palatina.4 Nosso objetivo é revisar a literatura internacional para identificar estudos que relatem complicações com fístulas palatinas, bem como apresentar nosso estudo de caso em detalhes.

Primeiramente fizemos uma pesquisa no PubMed para tentar identificar qualquer estudo publicado sobre ARF com complicação de fístula no palato mole, com a seguinte estratégia de busca: [(ablação por radiofrequência) E (ronco) E (fístula) OU (furo) OU (perfuração) E (palato mole)]. Uma pesquisa adicional foi feita com a seguinte estratégia: [(ablação por radiofrequência) E (complicações) E (palato)]. Posteriormente, resumimos os achados do paciente submetido primariamente à ARF do palato mole para ronco primário e que apresentou uma fístula temporária.

A estratégia de busca para ARF e fístula palatina no banco de dados da PubMed não apresentou relato de caso que discutisse a fístula palatina como complicação. Identificaram‐se artigos cujas complicações após a radiofrequência foram apresentadas como parte de uma série maior de casos; portanto, resumimos os cinco pacientes descritos entre outros pacientes e fornecemos conclusões detalhadas do nosso relato de caso.

Kezirian et al.4 fizeram uma revisão da incidência de complicações para pacientes submetidos a ARF da via aérea superior para incluir nariz, palato mole e língua. Analisamos os artigos que eles apresentaram em sua revisão4 e também fizemos nossa própria revisão bibliográfica, não identificamos artigos adicionais. Fizemos o download de cada artigo e resumimos o detalhes de cada publicação. Boudewyns et al.5 relataram um paciente que recebeu uma única ablação de linha média a 700 Joules (J) e desenvolveu uma fístula palatina (de 122 sessões de tratamento, taxa de 0,8%), que cicatrizou espontaneamente. Rombaux et al.6 fizeram a ARF em 4‐6 canais palatais (configurações não especificadas) em um paciente que desenvolveu uma fístula “menor” do palato mole, identificada seis semanas após a cirurgia; ele foi um de 17 pacientes (taxa de 5,9%) em que o caso se resolveu espontaneamente. Sher et al.7 relataram o procedimento com 460 quilohertz entre 60°‐90°C em dois pacientes que desenvolveram fístulas palatinas (de 113 pacientes, taxa de 1,9%) de 3‐4mm que fechou em alguns dias sem complicações adicionais. Emery et al.8 fizeram uma ablação de linha média a 700J e duas ablações laterais a 300J, totalizaram 1.200J a 85°C e descreveram um caso dentre 43 pacientes (2,3%), o qual apresentou uma fístula palatina, uma mulher de 33 anos com diabetes mellitus Tipo 1, e que foi fechada sob anestesia local. A fístula não recorreu após o fechamento primário. As fístulas palatinas anteriores foram relatadas como parte de artigos de séries de casos que descreveram todas as complicações da ARF. Que seja de nosso conhecimento, nenhum relato de caso foi descrito com dados detalhados do paciente, documentação fotográfica e a descrição do curso natural após ARF para ronco primário; portanto, relatamos os achados de um paciente tratado em nosso centro médico terciário.

O Conselho de Ética em Pesquisa (CEP) da nossa instituição foi contatado e este projeto não se encaixa na definição federal de pesquisa [DHHS 45 CFR 46.102(d)] ou na definição federal de investigação clínica [FDA 21 CFR 50.3(c) e 56.102(c)].

Relato de caso

Nosso paciente é um homem de 39 anos que se apresentou à clínica de otorrinolaringologia – cabeça e pescoço com a queixa de ronco “intenso” e fadiga. Sua esposa relatava que o ronco era grau 10 em uma escala de 10 (podia ser ouvido através de uma porta fechada e era significativamente perturbador para seu sono). Ele tinha história de hipotireoidismo, mas os exames tireoidianos mostravam: triiodotironina normal, 2,72 (intervalo de referência: 1,71‐3,8) e tiroxina livre 1,10 (intervalo de referência: 0,8‐1,6) com 200 microgramas de levotiroxina. Foi recomendado um estudo do sono e o ronco primário foi diagnosticado, com índice de apneia‐hipopneia de 3,0 eventos por hora, menor saturação de oxigênio de 91% e movimentos periódicos dos membros de 2,7 eventos por hora. No exame físico, o paciente apresentava um desvio septal nasal em forma de c9 (de natureza moderada). Com o Sistema de Classificação das Conchas Inferiores,10 ele tinha uma concha inferior direita de grau 4 e uma concha inferior esquerda de grau 3. No nível das coanas, havia 30% de obstrução secundária à hipertrofia adenoide. Apesar das anormalidades anatômicas nasais, ele negava qualquer obstrução nasal. Suas amígdalas apresentavam hipertrofia de 2+ bilateralmente, com tecido de palato mole redundante, grau 3 de Mallampati modificado. Ele tinha uma úvula anormalmente longa, media aproximadamente 1,8cm. Porque o ronco incomodava sua esposa de forma significativa, ele decidiu submeter‐se à ARF do palato mole. O procedimento foi feito na sala de cirurgia sob anestesia geral. O dispositivo Gyrus de radiofrequência foi ajustado para 81°C e 700J. A sonda foi passada na linha média e a 1 cm nas localizações paramedianas bilateralmente (2.100J total). O paciente foi avaliado uma semana após a cirurgia e estava bem, sem febre, dor ou complicação. Ele telefonou para a clínica e foi visto duas semanas após a cirurgia, após ter desenvolvido uma fístula palatal de 5mm×10mm que permitia a visualização da faringe (fig. 1A). Ele notou a fístula palatina porque podia senti‐la com a língua. Ele negou sangramento ou dor sem uso de medicação. O paciente não recebeu antibióticos, pois não havia sinais de infecção, e não havia literatura que apoiasse o uso de antibióticos profiláticos para uma apresentação de caso semelhante. Ele também foi aconselhado a manter uma dieta regular, mas a ter cuidado com alimentos duros ou crocantes que poderiam penetrar ou raspar a fístula. O paciente foi observado por quatro semanas adicionais e então apresentou fechamento completo da fístula, após cicatrização por segunda intenção (fig. 1B) e uma porção muito pequena (2mm) de ulceração mucosa que estava quase completamente cicatrizada. O ronco baseado nos relatos da esposa tinha melhorado significativamente para 2 em 10, na escala visual analógica, após oito semanas de pós‐operatório (no entanto, declarou em visitas posteriores que o ronco começava a reaparecer).

Figura 1.

A fístula palatina é mostrada em (A) e a fístula cicatrizada é mostrada em (B).

(0,09MB).
Discussão

Idealmente, o uso de energia através de ablação por radiofrequência no tecido muscular leva a uma maior eficácia desse procedimento. Consequentemente, os parâmetros de uso de energia pelos dispositivos de ablação por radiofrequência normalmente requerem configurações para detectar a resistência encontrada no tecido muscular. A energia baseada na resistência do tecido muscular excede a energia permitida para superar a resistência encontrada no tecido mucoso. A área de liberação máxima de energia se encontra no centímetro localizado na extremidade do dispositivo (tipo ponteira de radiofrequência de uso manual).

Como em qualquer procedimento cirúrgico, o resultado é também dependente do cirurgião. Portanto, o cirurgião deve empregar todas as medidas de precaução para garantir a colocação adequada da ponteira a uma profundidade adequada no tecido muscular. A avaliação da colocação específica da ponteira de ablação por radiofrequência pode ser um desafio, por isso recomendamos usar um espelho de Garcia para examinar a nasofaringe (via intraoral) durante o posicionamento da ponteira de ARF, para garantir que ela não esteja colocada muito profundamente. A colocação da ponta do dispositivo de ARF muito superficial ou muito profundamente pode causar danos térmicos à mucosa. Com base na proximidade da região de fornecimento máximo de energia de radiofrequência para a mucosa, o excesso de energia sobre a mucosa parece ser uma complicação potencial desse procedimento. Levantamos a hipótese de que o dano da radiofrequência à mucosa em uma configuração para efetuar a ablação do tecido muscular provavelmente apresenta o potencial de ablação destrutiva e desenvolvimento de uma fístula palatina. Se as três passagens de ablação destrutivas forem feitas muito perto umas das outras, então pode haver destruição excessiva de tecido, o que por sua vez aumenta a probabilidade de formação de fístula palatina. Considerando que uma fístula palatina é uma ferida aberta e o tecido saudável circundante apresenta perfusão abundante, não prescrevemos antibióticos para esse paciente. Contudo, é possível que possa existir um papel para os antibióticos em um paciente imunocomprometido (isto é, um paciente com síndrome de imunodeficiência humana ou um paciente diabético).

Na literatura internacional, identificamos cinco de 295 pacientes (taxa de 1,7%) que desenvolveram fístulas palatinas após ablação por radiofrequência do palato mole. Apenas um paciente foi tratado com fechamento primário e apresentava diabetes mellitus tipo 1. O fechamento primário foi provavelmente feito no contexto de um paciente com diabetes tipo 1, a qual é conhecida como uma doença que prejudica a cicatrização de feridas, especialmente se os níveis de glicemia forem mal controlados. Além do paciente submetido ao fechamento primário, os quatro pacientes restantes na literatura apresentaram cicatrização por segunda intenção. Em nosso paciente, com uma fístula palatina de 5mm×10mm, o palato cicatrizou por segunda intenção em seis semanas.

De modo geral, a ablação do palato mole por radiofrequência é um procedimento minimamente invasivo, geralmente limitado ao tratamento do ronco e AOS leve. A ablação do palato mole por radiofrequência também pode servir como tratamento adjuvante, feito simultaneamente com outros procedimentos sem adição de morbidade significativa. Pesquisas adicionais sobre a ablação do palato mole por radiofrequência podem ajudar a determinar a frequência e a gravidade das complicações dessa terapia como tratamento para o ronco e AOS.

Conclusão

Com base na literatura publicada, as fístulas palatinas secundárias à ablação por radiofrequência ocorrem em 1,7% das sessões de tratamento. Não identificamos paciente com fístula palatina persistente na literatura internacional; portanto, os pacientes que não são imunocomprometidos devem apresentar cicatrização por segunda intenção. Nosso paciente era um roncador primário, tratado com ablação por radiofrequência, que apresentou a maior fístula palatina relatada na literatura (5mm×10mm) e que foi resolvida através de cicatrização por segunda intenção após seis semanas de pós‐operatório.

Conflitos de interesse

Os autores declaram não haver conflitos de interesse.

Referências
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M. Camacho, M. Robertson, J. Abdullatif, V. Certal, Y.A. Kram, C.M. Ruoff, et al.
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[2]
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M. Camacho, S. Zaghi, V. Certal, J. Abdullatif, C. Means, J. Acevedo, et al.
Inferior turbinate classification system, grades 1 to 4: development and validation study.
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Como citar este artigo: Reckley LK, Fernandez‐Salvador C, Chang ET, Camacho M. Soft palate fistula after radiofrequency ablation for primary snoring: a case report and literature review. Braz J Otorhinolaryngol. 2020;86:S20–S22.

A revisão por pares é da responsabilidade da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico‐Facial.

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