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Vol. 86. Núm. 3.
Páginas 287-293 (Maio - Junho 2020)
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Vol. 86. Núm. 3.
Páginas 287-293 (Maio - Junho 2020)
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What do otolaryngologists want to learn? An educational targeted needs assessment study
O que os otorrinolaringologistas querem aprender? Um estudo de avaliação das necessidades educacionais específicas
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Mustafa Daloğlu
Autor para correspondência
drmustafadaloglu@gmail.com

Autor para correspondência.
, Mustafa Kemal Alimoğlu
Akdeniz University, Faculty of Medicine, Department of Medical Education, Antalya, Turquia
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Estatísticas
Tabelas (4)
Tabela 1. Características demográficas dos participantes
Tabela 2. Classificação média e mediana após duas rodadas do método Delphi
Tabela 3. Escores médios de necessidade de treinamento, estratificados pela experiência dos participantes
Tabela 4. Escores médios de necessidade de treinamento, estratificados pelo local de trabalho dos participantes
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Abstract
Introduction

Targeted needs assessment which includes identifying the needs of learners is a key step of program development. However, this step is commonly underestimated in postgraduate medical education programs, including otolaryngology residency training. Determining the needs of otolaryngologists may help educators to design more purposeful continuing medical education training programs. Furthermore, needs of specialists may provide a clearer insight about effectiveness of the residency programs in that specialty.

Objective

To determine training needs of otolaryngology specialists and to identify deficiencies in otolaryngology residency training programs.

Methods

Seventy‐eight otolaryngology specialists, who completed all data gathering forms properly, were included in this descriptive, cross‐sectional study. Demographic data of the participants were collected. Training needs of the participants were determined in seven basic areas of otolaryngology via two‐round Delphi method. The basic areas were otology–neurotology, rhinology, laryngology, head and neck surgery, pediatric otolaryngology, sleep disorders and facial plastic surgery. Additionally, we asked an open‐ended question to investigate the reasons why the participants perceived themselves incompetent and undereducated, or why they needed further training in some of the basic otolaryngology areas.

Results

Facial plastic surgery, otology‐neurotology and head and neck surgery were the most cited training areas in the needs assessment. Training needs differed according to experience and place of work. Financial expectations, deficiencies in residency training, regression in knowledge and skills, and special interest were effective determinants on decisions of the participants while determining their training needs.

Conclusion

Otolaryngologists need further training in some areas of their field due to different reasons. Determining these areas and reasons will help in designing more effective continuous medical education activities and residency training programs in otolaryngology.

Keywords:
Otolaryngology
Needs assessment
Education
Residency
Resumo
Introdução

A avaliação de necessidades específicas, que inclui a identificação das necessidades dos alunos, é um passo fundamental no desenvolvimento de programas educacionais. No entanto, essa etapa costuma ser subestimada em programas de pós‐graduação em educação médica, inclusive na residência em otorrinolaringologia. Determinar as necessidades dos otorrinolaringologistas pode ajudar os educadores a projetar programas mais direcionados de treinamento em educação médica continuada. Além disso, a análise das necessidades dos especialistas pode oferecer uma visão clara sobre a eficácia dos programas de residência nessa especialidade.

Objetivo

Determinar as necessidades de treinamento de especialistas em otorrinolaringologia e identificar deficiências nos programas de residência em otorrinolaringologia.

Método

Este estudo descritivo e transversal incluiu 78 especialistas em otorrinolaringologia que preencheram todos os formulários de coleta de dados adequadamente. Os dados demográficos dos participantes foram coletados. As necessidades de treinamento dos participantes foram determinadas em sete áreas básicas da otorrinolaringologia com o método Delphi em duas rodadas. As áreas básicas foram otologia/neurotologia, rinologia, laringologia, cirurgia de cabeça e pescoço, otorrinolaringologia pediátrica, distúrbios do sono e cirurgia plástica facial. Além disso, uma pergunta aberta foi usada para investigar os motivos pelos quais os participantes consideravam ter pouco conhecimento ou ser incapazes de atuar nessa área, ou por que precisavam de mais treinamento em algumas dessas áreas básicas.

Resultados

Na avaliação das necessidades, cirurgia plástica facial, otologia‐neurotologia e cirurgia de cabeça e pescoço foram as áreas de treinamento mais relatadas. As necessidades de treinamento variaram de acordo com a experiência e o local de trabalho. Expectativas financeiras, deficiências no treinamento durante a residência, regressão do conhecimento e habilidades, além de interesse especial, foram determinantes efetivos nas decisões dos participantes ao identificar suas necessidades de treinamento.

Conclusão

Por diferentes motivos, os otorrinolaringologistas precisam de mais treinamento em algumas áreas. A determinação dessas áreas e motivos ajudará a planejar atividades de educação médica continuada e programas de treinamento em residência em otorrinolaringologia mais eficazes.

Palavras‐chave:
Otorrinolaringologia
Avaliação das necessidades
Educação
Residência
Texto Completo
Introdução

De acordo com uma pesquisa feita no Reino Unido, 17% dos encaminhamentos na atenção primária na população adulta e 50% na população pediátrica são feitos para otorrinolaringologistas.1 Isso mostra a importância do ensino de graduação e pós‐graduação no campo da otorrinolaringologia para a saúde da comunidade.

No início dos anos 2000, a Associação Turca de Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço (TAO‐HNS) iniciou estudos para desenvolver um currículo básico para os cinco anos de residência em otorrinolaringologia na Turquia. As metas e os objetivos do currículo básico da residência foram definidos de acordo com as necessidades de saúde da comunidade. A associação também apresentou sugestões sobre estratégias educacionais e implantação do currículo de residência principal ao longo do tempo.

Ao desenvolver um currículo de educação médica em qualquer nível, a abordagem de seis etapas sugerida por Kern é comumente mencionada. Os passos são: 1) Avaliação de necessidades gerais, 2) Avaliação de necessidades específicas, 3) Metas e objetivos, 4) Estratégias educacionais, 5) Implantação e 6) Avaliação e feedback.2 Ao tentar combinar as etapas do modelo de Kern e a história do desenvolvimento de um currículo básico de residência em otorrinolaringologia na Turquia, os autores encontraram algumas tentativas que poderiam ser feitas a cada passo, com exceção de uma. O objetivo principal de qualquer currículo de graduação ou pós‐graduação em medicina é resolver problemas de saúde da comunidade. Portanto, o primeiro passo é a avaliação das necessidades gerais, que inclui a identificação dos problemas de saúde que serão abordados pelo currículo. Ao estabelecer metas e objetivos (o terceiro passo no modelo), a TAO‐HNS levou em consideração as doenças otorrinolaringológicas mais comuns como um modelo para o primeiro passo (avaliação das necessidades gerais). A associação também sugeriu alguns métodos de estratégias educacionais (Etapa 4), implantação (Etapa 5) e métodos de avaliação (Etapa 6) para os departamentos. Por exemplo, para atingir padrões mínimos aceitáveis em todo o país, a associação elaborou registros de residentes para uso em todos os departamentos.3 Entretanto, o segundo passo (avaliação das necessidades específicas), que inclui a identificação das necessidades dos alunos, foi ignorado, ou seja, as necessidades de aprendizagem dos residentes em otorrinolaringologia ainda não foram avaliadas. O aprendizado autodirigido é um dos métodos preferido de aprendizagem durante todo o processo de residência médica. Portanto, determinar as necessidades de aprendizagem, áreas de interesse ou expectativas pessoais pode ajudar os educadores a estimular o desenvolvimento profissional do residente.4

A TAO‐HNS também oferece atividades de educação médica continuada (EMC) para especialistas em otorrinolaringologia. Entretanto, o processo de desenvolvimento de tais programas não contempla a avaliação de necessidades específicas. A teoria da aprendizagem de adultos pressupõe que esses se motivam a aprender à medida que se deparam com necessidades e interesses que necessitem de maior estudo; portanto, esses são os pontos de partida mais apropriados na organização de atividades de aprendizagem para essa faixa etária.5 Consequentemente, fica claro que a avaliação das necessidades do grupo de alunos‐alvo, ou seja, o processo de identificar a lacuna entre a situação atual e a ideal, é um passo importante no desenvolvimento do currículo e merece atenção. Embora o conceito e a importância da avaliação de necessidades sejam bem aceitos, a literatura apresenta poucas informações sobre a educação médica de pós‐graduação.6

Este estudo usou a questão de pesquisa “quais são as lacunas de aprendizado e as necessidades de treinamento dos especialistas em otorrinolaringologia?” para avaliar as necessidades dos especialistas na área. A expectativa dos autores era que as respostas a essa pergunta também fornecessem algumas informações indiretas sobre as necessidades de aprendizado dos residentes, que serão especialistas em um futuro próximo. Portanto, o objetivo deste estudo foi determinar as necessidades de treinamento de especialistas em otorrinolaringologia e identificar áreas para maior ênfase nos programas de treinamento em residência nessa área.

MétodoDesenho do estudo

Este foi um estudo descritivo, transversal, feito com especialistas em otorrinolaringologia, para determinar as necessidades de treinamento dos participantes em sete áreas básicas da especialidade, previamente determinadas com o método Delphi de duas etapas. Além disso, investigaram‐se os motivos pelos quais os participantes consideravam ter pouco conhecimento ou ser incapazes de atuar nessa área, ou por que precisavam de mais treinamento em algumas das áreas básicas de otorrinolaringologia.

Participantes e questões éticas

A população‐alvo foram os especialistas em otorrinolaringologia da Turquia. No entanto, considerando as dificuldades para alcançar todos eles, os autores decidiram estudar uma população amostral que representasse diferentes grupos de idade, experiência, carreira ou afiliação. Os autores consideraram o congresso nacional como uma oportunidade para alcançar e encontrar o maior número possível de especialistas. Os formulários de coleta de dados foram entregues para 118 pessoas. Dessas, os 78 especialistas que completaram todos os formulários de coleta de dados em todas as rodadas foram incluídos no estudo. O Comitê de Ética em Estudos Clínicos Não Invasivos em Humanos da Universidade Akdeniz (Referência n° 06.10.2016/515) aprovou o estudo.

Formulários e processo de coleta de dados

Foi elaborado um formulário de dados escritos, que incluiu três partes: 1) Dados demográficos (idade, gênero, tempo de experiência como especialista e a instituição na qual o participante trabalha); 2) Uma lista para ser classificada por ordem de prioridade e 3) Pergunta aberta. A lista incluía os títulos de sete áreas básicas de otorrinolaringologia: 1) otologia‐neurotologia, 2) rinologia, 3) laringologia, 4) cirurgia de cabeça e pescoço, 5) otorrinolaringologia pediátrica, 6) distúrbios do sono e 7) cirurgia plástica facial. A lista foi criada com base nas áreas básicas de atividades de EMC, denominadas escolas de otorrinolaringologia, que são organizadas pela TAO‐HNS.

A técnica Delphi foi aplicada em duas rodadas para determinar as prioridades dos participantes quanto às necessidades de treinamento. A pesquisa Delphi é uma técnica de facilitação de grupo, que é um processo iterativo de múltiplos estágios, projetado para transformar a opinião em um consenso de grupo. É uma abordagem flexível, usada comumente nas ciências da saúde e sociais.7 No presente estudo, os formulários foram entregues aos participantes para que eles completassem a parte demográfica e ordenassem a lista com relação ao grau de necessidades de treinamento (ou deficiências). Atribuindo a cada item uma pontuação de 1 (área na qual o treinamento o participante mais precisa de treinamento) a 7 (área na qual o treinamento é menos necessário), os participantes classificaram o conteúdo da lista em relação aos níveis atuais de competência, necessidades e problemas frequentemente encontrados. Após receber todos os formulários preenchidos, os autores organizaram a lista de sete itens segundo a ordem de prioridade dada pelos participantes. Inverteu‐se a classificação atribuída pelos participantes, ou seja, 7 pontos foram atribuídos para o item que foi pontuado 1 (prioridade máxima) pelos participantes. Assim, foi possível organizar a lista de acordo com os valores médios dos itens; o item com valor médio máximo encabeçava a nova lista. Na segunda rodada, a nova lista (que representava as prioridades de treinamento) foi entregue aos participantes 10 dias depois. Os participantes foram instruídos a executar a mesma tarefa que fizeram na primeira rodada e reorganizar a lista. Quando as sugestões da segunda rodada foram avaliadas, foi criada uma lista final das áreas de treinamento classificadas pelos participantes em relação às suas prioridades em duas rodadas.

A terceira parte do formulário de coleta de dados era uma questão aberta, que foi usada para investigar os motivos pelos quais os participantes consideravam ter pouco conhecimento ou ser incapazes de atuar nessa área, ou por que precisavam de mais treinamento em algumas das áreas básicas da otorrinolaringologia.

Análise dos dados

Análises descritivas foram usadas para calcular os valores médios e medianos dos escores de necessidade de treinamento em cada área. Como a literatura indica que são necessários 10 anos de prática para alcançar a estrutura de conhecimento ideal e a estratégia de raciocínio clínico para precisão diagnóstica e tomada de decisão correta,8,9 o grupo de estudo foi dividido em duas categorias de acordo com a duração da experiência como especialista na área: 10 anos ou menos e mais de 10 anos. O teste t de Student foi usado para comparar os escores médios de necessidade de treinamento desses dois grupos de experiência em cada uma das sete áreas.

Os participantes foram divididos em três categorias de acordo com as instituições para as quais trabalhavam: hospitais de pesquisa e treinamento (inclusive hospitais universitários), hospitais públicos e hospitais/consultórios privados. O teste Anova com um fator foi usado para comparar os valores médios de necessidade de treinamento desses três grupos em cada uma das sete áreas. O software IBM SPSS Statistics, versão 20, foi usado para todas as análises estatísticas. As respostas à parte qualitativa do formulário de coleta de dados (terceira parte) foram categorizadas quanto aos principais temas mencionados nos textos.

Resultados

No presente estudo, a média de idade foi de 44,3 ± 12,1 (29 ± 72) anos e a relação feminino/masculino foi de aproximadamente 1/2. O tempo médio de experiência como especialista foi de 13,7 ± 11,2 (1–36) anos. A tabela 1 apresenta a distribuição dos participantes de acordo com a duração da experiência e dos locais de trabalho.

Tabela 1.

Características demográficas dos participantes

Características 
Idade  44,3 ± 12,1 
Gênero
Feminino  27 
Masculino  51 
Tempo de experiência como especialista (anos)
0–10  43 
Mais de 10  35 
Instituição
Hospitais de pesquisa e treinamento  24 
Hospitais públicos  35 
Hospitais/consultórios privados  19 

Na primeira rodada do método Delphi, as sete áreas de treinamento na lista foram ordenadas de acordo com as prioridades dos participantes, na seguinte ordem: 1) cirurgia plástica facial, 2) otologia‐neurotologia, 3) cirurgia de cabeça e pescoço, 4) laringologia, 5) distúrbios do sono, 6) rinologia e 7) otorrinolaringologia pediátrica. Essa ordem se manteve inalterada na reavaliação da classificação da lista pelos participantes na segunda rodada (tabela 2).

Tabela 2.

Classificação média e mediana após duas rodadas do método Delphi

  1a rodada2a rodada
  Média ± DP  Mediana  Média ± DP  Mediana 
Cirurgia plástica facial  5,1 ± 2,3  5,1 ± 2,2 
Otologia‐neurotologia  4,6 ± 1,9  4,8 ± 1,9 
Cirurgia de cabeça e pescoço  4,2 ± 1,9  4,5  4,4 ± 1,9 
Laringologia  3,9 ± 1,5  3,8 ± 1,5 
Distúrbios do sono  3,8 ± 2,0  3,8 ± 2,0 
Rinologia  3,7 ± 1,9  3,6 ± 1,8 
Otorrinolaringologia pediátrica  2,7 ± 1,6  2,6 ± 1,6 

A tabela 3 apresenta os escores médios de treinamento e as classificações de cada área de treinamento, estratificados pela experiência dos participantes: 10 anos ou menos e acima de 10 anos. A única diferença estatisticamente significante entre a média de necessidade de treinamento nos dois grupos de experiência foi encontrada na área de distúrbios do sono, a favor do grupo com mais de 10 anos de experiência (teste t de Student, p = 0,003).

Tabela 3.

Escores médios de necessidade de treinamento, estratificados pela experiência dos participantes

  ≤ 10 anos> 10 anospa 
  Classificação  Média ± DP  Classificação  Média ± DP   
Cirurgia plástica facial  5,4 ± 2,1  4,7 ± 2,4  0,143 
Otologia‐neurotologia  4,9 ± 1,8  4,6 ± 2,0  0,449 
Cirurgia de cabeça e pescoço  4,5 ± 1,8  4,3 ± 1,9  0,778 
Distúrbios do sono  3,2 ± 2,0  4,5 ± 1,6  0,003 
Laringologia  4,0 ± 1,4  3,5 ± 1,7  0,220 
Rinologia  3,6 ± 1,8  3,6 ± 2,0  0,965 
Otorrinolaringologia Pediátrica  2,4 ± 1,3  2,8 ± 1,8  0,334 
a

Teste t‐Student.

A tabela 4 apresenta os escores médios de treinamento e as classificações de cada área de treinamento, estratificados pelo local de trabalho dos participantes. Foram observadas diferenças significantes entre os grupos de locais de trabalho quanto aos escores médios nas áreas de cirurgia plástica facial, distúrbios do sono, laringologia e otorrinolaringologia pediátrica (Anova com um fator, p < 0,05 para todos).

Tabela 4.

Escores médios de necessidade de treinamento, estratificados pelo local de trabalho dos participantes

  Hospitais de pesquisa e treinamentoHospitais públicosHospitais/Consultórios privadospa 
  Classificação  Média ± DP  Classificação  Média ± DP  Classificação  Média ± DP   
Cirurgia plástica facial  3,9 ± 2,5  5,8 ± 1,8  5,3 ± 2,2  0,006 
Otologia‐neurotologia  4,8 ± 1,8  4,9 ± 1,9  4,5 ± 2,0  0,708 
Cirurgia de cabeça e pescoço  4,3 ± 2,3  4,7 ± 1,6  3,9 ± 1,9  0,279 
Distúrbios do sono  4,2 ± 2,1  3,2 ± 1,8  4,4 ± 1,9  0,040 
Laringologia  3,8 ± 1,2  4,2 ± 1,5  2,9 ± 1,6  0,007 
Rinologia  4,1 ± 2,0  3,1 ± 1,5  3,8 ± 2,1  0,111 
Otorrinolaringologia Pediátrica  2,8 ± 1,7  2,1 ± 1,3  3,2 ± 1,6  0,019 
a

ANOVA de uma via.

Ao analisar as respostas à questão aberta sobre motivos pelos quais os participantes consideravam ter pouco conhecimento ou ser incapazes de atuar nessa área, ou por que precisavam de treinamento em algumas das áreas básicas da otorrinolaringologia, quatro temas se destacaram: expectativas financeiras (n = 31), deficiências no treinamento recebido durante a residência (n = 44), regressão dos conhecimentos e habilidades ao longo do período pós‐treinamento (n = 19) e interesse especial na área (n = 40). Entre os participantes com expectativas financeiras, a área de treinamento preferida (81%) foi a de cirurgia plástica facial, enquanto a cirurgia de cabeça e pescoço (47%) se destacou entre aqueles que indicaram retenção de conhecimento e de habilidades como a razão pela qual necessitavam treinamento. A maioria dos participantes (47%) que necessitava treinamento devido a deficiências no treinamento recebido durante a residência preferiu a cirurgia plástica facial, que também foi a área de interesse especial mais frequentemente relatada (38%).

Discussão

Este estudo teve como objetivo determinar as necessidades de treinamento de otorrinolaringologistas e identificar áreas para maior ênfase nos programas de residência em otorrinolaringologia. Cirurgia plástica facial, otologia‐neurotologia e cirurgia de cabeça e pescoço foram as principais áreas de treinamento em que os participantes se consideraram inaptos e/ou necessitavam mais treinamento.

Os profissionais de saúde devem atender as necessidades de certos pacientes, além de usar as abordagens baseadas em evidências mais recentes.10 Com a atenção concentrada na manutenção das competências dos médicos e na eliminação de erros médicos, a EMC tem sido mais regulamentada e os provedores de EMC precisam atender a requisitos mais elevados.11 Ao criar ou revisar um currículo, a avaliação das necessidades específicas é uma etapa integral que deve ser feita antes da elaboração de metas e objetivos apropriados.2 As instituições de ensino e os educadores devem estar cientes das necessidades dos alunos.12 A avaliação das necessidades específicas para as atividades de EMC entre especialistas não apenas fornece informações sobre as necessidades dos alunos, mas também ajuda na avaliação dos programas de residência em que esses especialistas se formaram. Em outras palavras, a percepção comum de incompetência e necessidade de treinamento adicional em algumas áreas da especialidade pode indicar deficiências no treinamento recebido durante a residência. Um modelo comumente usado, os quatro níveis de avaliação de programas de Kirkpatrick examinam: 1) reação do aluno ao programa (satisfação), 2) aprendizagem (confirmada pelo processo de avaliação), 3) mudança de comportamento (aplicação do conhecimento e habilidades adquiridos na prática) e 4) resultados alcançados em termos de serviços para a população.13 Os resultados do presente estudo apresentam informações para o terceiro nível do modelo de avaliação de programas de Kirkpatrick, indicam as áreas do currículo de residência nas quais os participantes se sentiam bem ou mal preparados para atuar na prática real.

Entre os participantes do presente estudo, a cirurgia plástica facial encabeçava a lista de necessidades de treinamento. Recentemente, tem sido observado um interesse crescente em procedimentos estéticos faciais, especialmente entre adultos jovens.14 A Turquia é o nono país do mundo em procedimentos estéticos na face e cabeça, com 132.564 casos (3,1% do total de casos no mundo) por ano.15 Se a demanda determina a oferta, fica claro que os otorrinolaringologistas enfrentam uma grande carga de trabalho e pressão na cirurgia plástica facial. Essa carga de trabalho e/ou pressão pode ser a razão pela qual a cirurgia plástica facial foi apontada como a área na qual os participantes mais sentiam a necessidade de treinamento adicional. A literatura indica que expectativas de renda mais altas desempenham um papel motivador na seleção da área de treinamento entre especialistas.16 A crescente demanda por procedimentos estéticos também pode ser percebida como um mercado maior, com melhores oportunidades de renda entre os otorrinolaringologistas. Esse pode ser outro fator que levou a cirurgia plástica facial ao topo da lista de necessidades de treinamento. Como dados de apoio, o presente estudo indicou que a cirurgia plástica facial foi a área preferida (81%) entre os participantes, que relataram as expectativas financeiras como a principal razão para suas necessidades de treinamento. Por fim, as deficiências no treinamento recebido durante a residência podem ser outra razão para a alta prioridade dada à cirurgia plástica facial. No presente estudo, os participantes apontaram a cirurgia plástica facial como sua área favorita e relataram deficiências no treinamento recebido durante a residência como o principal fator na determinação de suas necessidades de treinamento. O interesse pela cirurgia plástica facial foi menor entre os participantes que trabalham em hospitais de pesquisa e treinamento, possivelmente devido ao fato de que tais instituições, como prestadores de serviços de atenção terciária, estão mais focadas em casos desafiadores de campos como otologia, neurotologia ou cirurgia de cabeça e pescoço.

Otologia‐neurotologia foi a segunda área favorita entre os presentes participantes. Esse achado pode ser explicado por desenvolvimentos tecnológicos significativos no diagnóstico e tratamento das doenças nessa área.17 Além do conhecimento teórico em rápida expansão, o número de competências procedimentais também está se multiplicando. A natureza complexa dos procedimentos de otologia‐neurotologia pode gerar longas curvas de aprendizagem. Assim, atingir o nível de especialização desejado em um programa de treinamento de residência de cinco anos pode ser desafiador. Portanto, o treinamento inadequado recebido durante a residência no campo da otologia‐neurotologia pode ser a razão subjacente para a necessidade de treinamento nessa área, comumente indicada pelos participantes do presente estudo.

Médicos de todas as especialidades cuidam de um número cada vez maior de pacientes com câncer e aqueles em remissão.18 Esse dado enfatiza a crescente importância da cirurgia de cabeça e pescoço (terceira área de treinamento apontada como mais necessária no presente estudo) entre as outras subespecialidades de otorrinolaringologia. As rotações de cirurgias de cabeça e pescoço durante a residência geralmente são estruturadas de forma intensa; além disso, os procedimentos são complicados e demorados. Alguns estudos relatam que, durante a rotação de cirurgia de cabeça e pescoço, os residentes têm significativamente menos horas de sono e mais horas de trabalho por semana em comparação com outras rotações.19 A carga excessiva de trabalho dos residentes pode levar ao esgotamento, o que poderia diminuir a qualidade do treinamento de residência por meio de um comportamento motivacional, o que também pode diminuir a qualidade do atendimento aos pacientes.20 Portanto, os participantes do presente estudo podem ter proeminentemente indicado a cirurgia de cabeça e pescoço como uma área na qual eles necessitam treinamento por não terem recebido uma educação adequada durante a residência. Ademais, além da prática, cirurgias de cabeça e pescoço também demandam infraestrutura e equipamentos especiais para sua feitura. Os especialistas que trabalham em hospitais que não estão bem equipados para cirurgia de cabeça e pescoço naturalmente evitam intervenções sofisticadas e cansativas nessa região para não correr riscos. Essa atitude pode causar regressão tanto no conhecimento quanto nas habilidades cirúrgicas. Sabe‐se que, com o tempo, a perda de competência pode acontecer até mesmo em habilidades clínicas mais simples, caso essas habilidades não sejam praticadas após o treinamento.21 Consequentemente, a perda de competência em algum grau pode ser outro fator que levou os participantes a indicarem a necessidade de treinamento em cirurgia de cabeça e pescoço. Essa hipótese também é corroborada pela descoberta de que a cirurgia de cabeça e pescoço foi a área preferida (47%) entre os participantes que relataram a regressão de conhecimentos e habilidades como a principal razão para suas necessidades de treinamento.

Os participantes com experiência superior a 10 anos relataram mais frequentemente a necessidade de treinamento na área de distúrbios do sono do que seus colegas menos experientes. Esse achado pode estar associado à história da medicina do sono na Turquia. A medicina do sono tem sido o foco de interesse na comunidade de otorrinolaringologia, especialmente nas últimas décadas.22 Portanto, os especialistas experientes não foram treinados nesse campo durante o seu período de residência, uma vez que os distúrbios do sono não estavam incluídos no currículo. É possível que outras áreas tenham sido incluídas nos programas de residência dos participantes, mas com um ensino deficiente. Isso porque 56% dos participantes apontaram deficiências no período de residência como principal razão para as necessidades de treinamento. Tais deficiências foram relatadas na literatura. Por exemplo, Baugh et al. mostrou que, apesar de os requisitos de credenciamento indicarem a quantidade mínima de procedimentos‐chave, residentes podem se formar sem atender a esses mínimos.23

Como indicado na tabela 4, o nível de interesse dos participantes em algumas áreas de treinamento diferiu de acordo com o local de trabalho. O possível motivo do menor interesse pela cirurgia plástica facial entre aqueles que trabalham em hospitais de treinamento e pesquisa já foi informado. Entretanto, o menor interesse em distúrbios do sono e otorrinolaringologia pediátrica entre os participantes que trabalham em hospitais públicos e o baixo interesse em laringologia entre aqueles que trabalham em hospitais/consultórios privados são achados que podem não ser explicados facilmente. Essas podem ser áreas nas quais os participantes se sentem altamente competentes. Outra razão pode ser o perfil do paciente, que varia de acordo com a instituição onde o profissional trabalha; assim, eles podem não precisar de qualquer treinamento adicional em casos raramente vistos.

Dados qualitativos adicionais trariam informações valiosas sobre as razões por trás dos achados do presente estudo. Portanto, a primeira limitação do estudo é a escassez de dados qualitativos. A segunda limitação importante diz respeito à generalização dos resultados, uma vez que dados obtidos de um número limitado de otorrinolaringologistas em um único país não podem ser extrapolados.

Conclusão

Observou‐se que a cirurgia plástica facial, otologia‐neurotologia e cirurgia de cabeça e pescoço foram as principais áreas de formação nas quais os otorrinolaringologistas turcos se consideraram inaptos e/ou necessitavam mais treinamento. Os fatores subjacentes foram problemas com processos de aprendizagem, preferências financeiras e sociais e experiência e interesse pessoal dos otorrinolaringologistas. Estudos mais bem projetados, que usem uma combinação de métodos qualitativos e quantitativos em populações maiores de diferentes países e culturas, são necessários para se obterem resultados mais confiáveis. Os achados de tais estudos ajudarão no planejamento de atividades de educação médica continuada em otorrinolaringologia mais orientadas e programas de treinamento mais bem estruturados para residentes.

Conflitos de interesse

Os autores declaram não haver conflitos de interesse.

Contribuição dos autores

Tanto Daloglu M. como Alimoglu MK desenharam e executaram o estudo, analisaram os dados e escreveram o manuscrito. Todos os autores leram e aprovaram o manuscrito final.

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Como citar este artigo: Daloğlu M, Alimoğlu MK. What do otolaryngologists want to learn? An educational targeted needs assessment study. Braz J Otorhinolaryngol. 2020;86:287–93.

A revisão por pares é da responsabilidade da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico‐Facial.

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