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Vol. 82. Núm. 3.
Páginas 289-296 (Maio 2015)
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Efeitos da amplificação sonora na autopercepção do zumbido e da perda auditiva em idosos
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Tiago de Melo Araujoa, Maria Cecília Martinelli I?riob
a Programa de Pós-graduação em Ciências, Departamento de Fonoaudiologia, Escola Paulista de Medicina, Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), São Paulo, SP, Brasil
b Departamento de Fonoaudiologia, Escola Paulista de Medicina, Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), São Paulo, SP, Brasil
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Estatísticas
Tabelas (6)
Tabela 1. Estatísticas descritivas e estudo comparativo entre os momentos de avaliação para a sensação de intensidade sonora (dB NS) do zumbido na orelha direita (GZ)
Tabela 2. Estatísticas descritivas e estudo comparativo entre os momentos de avaliação para a sensação de intensidade sonora (dB NS) do zumbido na orelha esquerda (GZ)
Tabela 3. Estatísticas descritivas e estudo comparativo entre grupos, por momento, para a EVA (incômodo com a perda auditiva)
Tabela 4. Estatísticas descritivas e estudo comparativo entre os momentos de avaliação para a EVA (incômodo com o zumbido) (GZ)
Tabela 5. Estatísticas descritivas e estudo comparativo entre os momentos de avaliação para o escore total do questionário THI (GZ)
Tabela 6. Estatísticas descritivas e estudo comparativo entre grupos, por momento, para o escore total e por questão do QI-AASI
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Objetivo: Verificar o efeito do uso de próteses auditivas na autopercepção do zumbido e da perda auditiva em idosos.

Método: Foram avaliados 24 idosos com perda auditiva neurossensorial de grau moderado e idades entre 60 e 70 anos divididos em dois grupos conforme a presença ou não de zumbido. Todos os voluntários foram adaptados binauralmente com próteses auditivas micro canais de mesmo fabricante e modelo e submetidos a testes, escalas e questionários pertinentes ao tema. As avaliações ocorreram pré, e após um e três meses de uso efetivo das próteses auditivas.

Resultados: A estimulação acústica por meio do uso efetivo de próteses auditivas propiciou redução na autopercepção da intensidade sonora do zumbido (principalmente nas avaliações com as próteses) e no desconforto com este sintoma e com a perda auditiva. Além disso, todos os participantes mostraram-se satisfeitos com o uso dos dispositivos de amplificação.

Conclusão: O uso contínuo das próteses auditivas é benéfico ao tratamento do zumbido e da perda auditiva, além de implicar na satisfação dos usuários.

Palavras-chave:
Questionários
Escalas
Idoso
Zumbido
Auxiliares de audição

Objective: To determine the effect of the use of hearing aids in self-perception of tinnitus and hearing loss in the elderly.

Methods: A total of 24 elderly patients between 60 and 70 years of age with moderate-grade sensorineural hearing loss were evaluated and divided into two groups according to the presence or absence of tinnitus. All volunteers were fitted with binaural micro-channel hearing aids of the same brand and model and submitted to tests, scales, and questionnaires relevant to this topic. The evaluations were performed before and after one and three months of effective use of these hearing aids.

Results: Acoustic stimulation through the effective use of hearing aids caused a reduction in the perception of tinnitus sound intensity (especially in evaluations with the prosthesis on) and in nuisance associated with this symptom and with hearing loss. In addition, all participants were satisfied with the use of hearing aids.

Conclusion: The continuous use of hearing aids is beneficial for the treatment of tinnitus and hearing loss, bringing satisfaction to users.

Keywords:
Questionnaires
Scales
Elderly
Tinnitus
Hearing aids
Texto Completo

Introdução

O zumbido, percepção sonora por um indivíduo na ausência de uma fonte geradora externa,1 segundo a Organização Mundial de Saúde, é um sintoma que acomete cerca de 278 milhões de pessoas no mundo e, no Brasil, cerca de 28 milhões.2 Dados internacionais apontam que a prevalência de zumbido na população geral subiu de 15 para 25,3% em apenas 15 anos, e que estes números crescem com o aumento da idade.3

Aproximadamente 20% dos pacientes com zumbido crônico (quando presente há mais de três meses) apresentam incômodo significativo4 e queixas como: falhas no raciocínio, na memória e na concentração, na discriminação de fala e na manutenção da atenção seletiva, prejudicando as atividades de lazer, o repouso, o convívio no ambiente social, entre outros.5-7

A diminuição temporária ou permanente dos estímulos auditivos (déficit sensorial) aumentaria a sensibilidade dos neurônios subcorticais, resultando em uma reorganização plástica do córtex auditivo com consequente percepção constante do zumbido.8,9

A literatura aponta que a sensação de intensidade em relação ao zumbido pode estar relacionada ao incômodo gerado pelo mesmo,10,11 e que há diversos instrumentos12-15 que podem ser utilizados para avaliar e monitorar o tratamento de pacientes que sofrem com este sintoma, dentre os quais são destacados o teste de acufenometria, a Escala Visual-Analógica (EVA) e o questionário Tinnitus Handicap Inventory (THI). Ainda, em pacientes que possuem o sintoma zumbido associado a uma perda auditiva, pode-se acrescentar o Questionário Internacional – Aparelho de Amplificação Sonora Individual (QI-AASI) quando a reabilitação se dá por meio do uso de próteses auditivas.

Estudos sobre plasticidade sugeriram que o aumento do estímulo auditivo proporcionado pela amplificação sonora por meio do uso de próteses auditivas pode induzir à plasticidade secundária, contribuindo para a diminuição do desconforto com o zumbido.16,17

Nessa perspectiva, as hipóteses que embasaram a realização da presente pesquisa foram de que o uso da amplificação sonora reduziria a sensação de intensidade do zumbido em idosos deficientes auditivos e diminuiria o desconforto com ambos os sintomas (zumbido e perda auditiva), determinando o sucesso da adaptação do paciente às próteses auditivas.

Ainda, visto que a presença de zumbido também interfere na autopercepção da saúde em idosos,18 o presente estudo teve como objetivo verificar o efeito do uso de próteses auditivas na autopercepção do zumbido em idosos deficientes auditivos.

Método

Esta pesquisa foi realizada no Núcleo Integrado de Assistência, Pesquisa e Ensino em Audição (NIAPEA) do Departamento de Fonoaudiologia da Escola Paulista de Medicina/ Universidade Federal de São Paulo (EPM/UNIFESP) durante os anos de 2013 e 2014, após aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da UNIFESP, com Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) nº 09876112.1.0000.5505.

Esta englobou um estudo com intervenção prospectiva e amostra não probabilística que acompanhou e avaliou 24 idosos com faixa etária entre 60 e 70 anos, divididos em dois grupos conforme a presença ou não do sintoma zumbido. A participação dos sujeitos foi voluntária e confirmada mediante assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

Inicialmente, foi realizado um levantamento com a análise de prontuários de todos os pacientes que ingressaram no serviço entre os anos de 2010 e 2013, de modo a verificar a ocorrência do sintoma zumbido na população atendida no NIAPEA.

Foram analisados 3.580 prontuários, descartando-se aqueles fora da faixa etária pretendida no estudo, culminando em 658 prontuários. Destes, verificou-se que 512 (78%) pacientes referiram a presença de zumbido (com incômodo ou não) e 146 (22%) mencionaram não possuir o sintoma.

Nesta perspectiva, foram definidos os critérios de elegibilidade para a composição da amostra e formação dos grupos estudo (GZ – grupo com zumbido) e controle (GsZ – grupo sem zumbido).

Os critérios, para ambos os grupos, foram: presença de perda auditiva adquirida, neurossensorial bilateral e de grau moderado (média dos limiares auditivos tonais de 41 a 60 dB NA nas frequências de 500, 1.000, 2.000 e 4.000 Hz); configuração audiométrica plana ou levemente descendente; índice percentual de reconhecimento de fala maior ou igual a 76%; e curvas timpanométricas tipo A em ambas as orelhas. Ainda, deveriam ter o português brasileiro como língua materna e serem candidatos ao uso de próteses auditivas micro canais binauralmente.

Para o GZ: após a primeira seleção, os pacientes que cumpriram tais critérios foram submetidos à Escala Visual Analógica (EVA) e ao Tinnitus Handicap Inventory (THI), pois apenas permaneceram no grupo os pacientes com zumbido de percepção constante e de forma incômoda, conforme os critérios definidos para este estudo: pontuação da EVA ≥ 5 (a partir do grau moderado) e pontuação do questionário THI ≥ 38 (a partir do grau moderado).19

Para o GsZ: bastava não possuir o sintoma em estudo. Foram excluídos os sujeitos com alterações neurológicas, articulatórias e/ou de fluência verbais evidentes, e aqueles com experiência anterior com o uso de próteses auditivas.

Após toda a investigação, por meio da análise de prontuários, contato telefônico e/ou presencial, tendo em vista os critérios de elegibilidade acima elencados, a amostra final foi composta por 24 voluntários, sendo 18 do gênero feminino e seis do gênero masculino, distribuídos em dois grupos de 12 para GZ e GsZ.

Procedimentos

Os idosos do GZ que cumpriram os critérios de elegibilidade foram submetidos ao teste de acufenometria (medidas da sensação de frequência e intensidade sonora do zumbido), a EVA (graus subjetivos de incômodo causados pela perda auditiva e pelo zumbido) e aos questionários THI (grau subjetivo de incômodo causado pelo zumbido) e QI-AASI (sucesso da adaptação do paciente às próteses auditivas). Ao GsZ foi aplicado a EVA (grau subjetivo de incômodo causado pela perda auditiva) e o QI-AASI.

Neste estudo, considerou-se uso efetivo das próteses auditivas quando o registro de tempo de uso apontava, no mínimo, 8h/dia. Todos os idosos foram adaptados com próteses auditivas microcanais, do mesmo fabricante e modelo, cuja faixa de frequência descrita na ficha técnica encontra-se entre 150 Hz e 7.000 Hz.

O teste de acufenometria utilizado para mensurar aspectos como a sensação de frequência e de intensidade do zumbido é bastante útil na avaliação e no monitoramento do tratamento de pacientes com este sintoma,14 tendo sido aplicado em três momentos: antes da adaptação das próteses auditivas (T1), com um mês (T2) e com três meses (T3) de uso efetivo das mesmas. Em T2 e T3 os testes foram aplicados com e sem os dispositivos e, para sua realização, foi utilizado um audiômetro da marca Grason-Stadler modelo GSI 61 com fones supra-aurais TDH 50P.

A EVA, de fácil aplicação e a mais utilizada nos estudos sobre o tema,14 com possibilidade de notas entre zero e dez, atribuídas pelo paciente, reflete o incômodo com o sintoma avaliado (zumbido ou perda auditiva) de maneira simples e objetiva.

O THI, questionário desenvolvido20 em 1996, adaptado12 e validado21 para o português brasileiro, avalia os aspectos emocional, funcional e catastrófico do paciente com zumbido.

O QI-AASI, questionário proposto22 em 2002, traduzido e adaptado15 para o português, reflete o sucesso da adaptação do paciente às próteses auditivas, por meio da avaliação dos seguintes domínios: uso, benefício, limitação de atividades, satisfação, restrição de participação, impacto da perda auditiva no convívio com outras pessoas e qualidade de vida. Estes domínios somente são avaliados na condição com próteses auditivas, após experiência com o uso da amplificação.

Método estatístico

Na análise estatística foram utilizados os softwares SPSS V17, Minitab 16 e Excel Office 2010, e os testes estatísticos Wilcoxon (evolução dos indivíduos dentro do próprio grupo) e Mann -Whitney (comparação entre os grupos). Neste estudo, adotou-se o nível de significância de 0,05 (5%) para o tratamento estatístico. Nas tabelas, os valores estatisticamente significantes foram assinalados com um asterisco [*]; já aqueles que estavam próximos do limite de aceitação, com tendência a serem significativos (até 5 pontos percentuais acima do valor do α adotado), foram assinalados com uma cerquilha [#].

Resultados

Foram avaliados 24 idosos, sendo 12 mulheres com idades variando de 61 a 70 anos (média de 66,9) no GZ, e seis homens e seis mulheres com idades entre 61 e 69 anos (média de 64,5) no GsZ.

Quanto à escolaridade, foi observada uma variação de 5 a 10 anos para o GZ, e de 6 a 10 anos para o GsZ.

Sobre o tempo decorrido desde os primeiros sintomas da perda auditiva até a intervenção por meio de próteses auditivas, ambos os grupos apresentaram variação entre 2 e 30 anos de privação auditiva, com média de 8,7 anos para o GZ e de 8,2 anos para o GsZ.

Quanto ao tempo decorrido desde o aparecimento do sintoma zumbido até a adaptação das próteses auditivas, o GZ apresentou média de 10,5 anos, com variação entre 4 e 30 anos.

No GZ, quanto à descrição do tipo de zumbido (referida pelo paciente) e à medida da sensação de frequência do mesmo (acufenometria), pôde-se observar predomínio de 100% de zumbidos do tipo “tom puro”, com descrições como apito, grilo, campainha, assobio e cigarra, e sensações de frequência em torno de 2.000 e 8.000 Hz, com média de 5.300 Hz para a orelha direita e 5.100 Hz para a orelha esquerda.

Quanto à sensação de intensidade sonora provocada pelo zumbido (acufenometria), no GZ foi observada redução significativa ao longo das avaliações, em ambas as orelhas (tabelas 1 e 2).

Quanto ao incômodo com a perda auditiva, medido pela EVA, verificou-se que as médias referentes ao incômodo com a perda auditiva decresceram ao longo do tempo, em ambos os grupos, com diferença estatisticamente significante em T3, momento no qual o GsZ apresentou menor incômodo, quando comparado ao GZ (tabela 3).

Quanto ao incômodo com o zumbido, medido pela EVA, no GZ foi constatado que houve redução significante na sensação de intensidade do zumbido nos momentos T2 e T3, em relação ao momento T1 (tabela 4).

Para a pontuação total do questionário THI, ao longo das avaliações foi observada redução significante da queixa de incômodo referente ao zumbido. Em T1, o incômodo era moderado, em T2 tornou-se leve, e em T3 desprezível (tabela 5).

Com relação à pontuação do questionário QI-AASI, os grupos se mostraram homogêneos nas comparações entre os momentos T2 e T3 em relação a T1, seja quanto à pontuação total ou por questão (sem diferença estatística significante) (tabela 6).

Discussão

Optou-se por estudar idosos em uma faixa etária restrita, tendo em vista que o processo de envelhecimento promove mudanças orgânicas e fisiológicas no sistema auditivo.23 Assim sendo, evitou-se comparar o desempenho de idosos com idades muito distintas. É grande a ocorrência de zumbido em indivíduos com idades entre 55 e 75 anos.24

Pode-se observar uma proporção maior de idosas nesta pesquisa (18 mulheres, sendo 12 no GZ). Há ocorrência maior do sintoma no gênero feminino,24,25 no entanto, é importante ressaltar que as mulheres sempre demonstraram maior preocupação com a deterioração da audição, assim como com a saúde em geral.26

Estudos sobre plasticidade sugeriram que o aumento do estímulo auditivo proporcionado pela amplificação sonora pode induzir à plasticidade secundária,16,17 e pode, ainda, diminuir o desconforto e a mudança do foco de atenção em relação ao zumbido, pois ocorreria diminuição da hiperatividade em regiões da via auditiva e em vias não auditivas, como as associadas com percepção, atenção, memória e reações emocionais.27

Corroborando com o presente estudo, observou-se maior ocorrência (66%) de zumbidos do tipo “tom puro”, no entanto, com frequências em torno de 6.000 e 8.000 Hz.28 Ainda, na atual pesquisa, o valor médio encontrado para a sensação de frequência do zumbido está dentro da faixa de frequências de amplificação da prótese auditiva, o que poderia explicar o bom prognóstico quanto à redução do incômodo associado ao sintoma. Em outro trabalho, foi encontrada média similar (5.333 Hz), com menção à importância da escolha da prótese auditiva segundo a faixa de frequências.29 Outro estudo observou redução significante da intensidade sonora do zumbido em indivíduos cuja frequência do sintoma encontrava-se abaixo de 6.000 Hz, concluindo que a frequência do zumbido deve ser considerada como um importante fator no sucesso com a amplificação.30

Quanto à sensação de intensidade sonora provocada pelo zumbido, foi observada redução significante ao longo das avaliações, em ambas as orelhas (tabelas 1 e 2). Vale ressaltar que, nas avaliações com próteses auditivas, esta sensação de intensidade foi menor quando comparada às avaliações sem as mesmas. Este fato demonstrou o efeito benéfico da estimulação acústica contínua sobre a percepção do zumbido pelo paciente. Assim como nos resultados descritos, foram observados níveis de sensação de intensidade do zumbido entre 5-10 dB NS.31

Outros autores32 não verificaram efeito da prótese auditiva na sensação de intensidade sonora do zumbido em nenhum dos grupos estudados, e concluíram que um mês de tratamento foi insuficiente para demonstrar os efeitos da amplificação na plasticidade cerebral. Entretanto, os autores não referiram o tempo de uso efetivo das próteses auditivas pelos participantes, pois, na presente pesquisa, resultados positivos foram observados desde o primeiro mês de uso.

Quanto ao incômodo ocasionado pela perda auditiva, medido pela EVA, foi observada redução significante ao longo das avaliações, em ambos os grupos (tabela 3), sendo notada diferença estatística apenas em T3, momento no qual o GsZ apresentou menor incômodo, quando comparado ao GZ. A literatura25 refere que o incômodo gerado pelo zumbido é adicionado à deficiência auditiva, dificultando para o paciente o isolamento dos sintomas para definir a quantificação do incômodo.

Comparando-se os resultados do GZ para o incômodo com a perda auditiva e com o zumbido (tabela 4), é possível observar maior incômodo com o zumbido do que com a perda auditiva em T1. Em T3, a média que retrata o incômodo com o zumbido é menor que a média que reflete o incômodo com a perda auditiva, ou seja, o sintoma que mais incomodava foi o de maior melhora. Na literatura especializada,33,34 o incômodo com o zumbido pode cessar de forma imediata com o uso da prótese auditiva, o que não acontece com a perda auditiva em termos de percepção e compreensão da fala.

Nos casos em que perda auditiva e zumbido ocorrem conjuntamente, é indicado35 investigar qual desses sintomas provoca maior incômodo, a fim de direcionar a abordagem terapêutica. Na presente pesquisa, o GZ apresentou maior incômodo com o zumbido; por isso, além do uso da amplificação, foi necessário que os participantes compreendessem a fisiopatologia do sintoma e o papel da reabilitação, ajudando-os a diminuir a ansiedade e controlar a expectativa.

Os achados da presente pesquisa corroboram com resultados,36 nos quais foi observada uma redução do incômodo com a perda auditiva em 96% dos participantes, após adaptação de próteses auditivas. As autoras também enfatizaram as mudanças plásticas positivas no sistema nervoso central com o uso contínuo dos dispositivos.

Na presente pesquisa, todos os voluntários apresentavam perda auditiva neurossensorial, ou seja, o incômodo com o zumbido poderia advir da diminuição permanente dos estímulos auditivos com aumento da sensibilidade dos neurônios nos centros subcorticais, e o tratamento por meio de próteses auditivas minimizaria o déficit periférico, fazendo com que o sinal acústico fosse mais elaborado no sistema nervoso auditivo central (SNAC).37

A atual pesquisa mostrou que os mecanismos de plasticidade também ocorrem durante a terceira idade, ou seja, não se deve recear quanto ao início das intervenções terapêuticas em idosos.

Ainda sobre o incômodo ocasionado pelo zumbido, a aplicação do questionário THI (tabela 6) permitiu observar que, ao longo das avaliações, houve redução significante da queixa de incômodo referente ao zumbido, seja no escore total ou por escala. Em T1, o incômodo era moderado; em T2, tornou-se leve; e em T3, desprezível.

Há relação direta entre a pontuação deste questionário e o incômodo com o zumbido,38,39 ou seja, é nítido que houve redução no incômodo ao longo do tempo.

Quanto ao resultado da aplicação do QI-AASI (tabela 6), os grupos se mostraram homogêneos nas comparações entre os momentos T2 e T3 em relação ao momento T1, seja quanto à pontuação total ou por questão (sem diferença estatística significante). Um estudo40 mencionou que a redução do sintoma zumbido, por meio do uso de próteses auditivas, pode influenciar a satisfação do usuário do dispositivo de amplificação. No atual estudo, verificou-se que ambos os grupos obtiveram alta pontuação já no momento T2, atingindo 34 pontos em T3, resultados positivos também encontrados em outras pesquisas.41,42

Quanto ao grupo GZ, no qual foi observado benefício quanto à diminuição da percepção e do incômodo com o zumbido, justifica-se o nível de satisfação com o uso das próteses. Em alguns casos, pacientes com zumbido estão mais preocupados em aliviar o sintoma do que propriamente minorar suas dificuldades por meio de próteses auditivas, considerando o seu uso apenas se ocorrer o mascaramento do zumbido.40

Ainda com relação ao QI-ASSI, verificou-se43 que não há correlação entre as variáveis gênero, idade, grau, tempo da perda auditiva, lado de adaptação da prótese auditiva, tempo de adaptação e categoria do dispositivo de amplificação com o grau de satisfação do usuário medido pelo QI-AASI. Sendo assim, estas variáveis não interfeririam nos resultados obtidos por meio do questionário.

Os resultados deste estudo revelaram uma significante redução na autopercepção do zumbido em termos de intensidade sonora e no desconforto ocasionado por este sintoma, assim como pela perda auditiva. É importante ressaltar que o desempenho dos voluntários do GZ nas reavaliações do teste de acufenometria foi ainda melhor quando estes foram avaliados com os dispositivos, o que reforça a importância da orientação ao paciente quanto ao uso contínuo das próteses auditivas.

Conclusão

A partir dos dados obtidos, foi possível concluir que, ao longo das avaliações, em ambos os grupos foi observada redução do desconforto ocasionado pela perda auditiva e, ainda, que a sensação de intensidade sonora e o desconforto causado pelo zumbido foram reduzidos após intervenção com estimulação acústica por meio da amplificação sonora. Quanto ao sucesso da adaptação às próteses auditivas, não houve diferença entre os grupos.

Financiamento

Este estudo foi financiado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)

Conflitos de interesse

Os autores declaram não haver conflitos de interesse.


Recebido em 14 de abril de 2015;

aceito em 12 de maio de 2015

DOI se refere ao artigo: http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2015.05.010

☆ Como citar este artigo: Araujo TM, Iório MCM. Effects of sound amplification in self-perception of tinnitus and hearing loss in the elderly. Braz J Otorhinolaryngol. 2016;82:289-96.

☆☆ Trabalho realizado no Núcleo Integrado de Assistência, Pesquisa e Ensino da Audição (NIAPEA) do Departamento de Fonoaudiologia, Escola Paulista de Medicina, Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), São Paulo, SP, Brasil.

* Autor para correspondência.

E-mail:tiagoaraujofono@yahoo.com.br (T.M. Araujo).

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Articles submitted as of May 1, 2022, which are accepted for publication will be subject to a fee (Article Publishing Charge, APC) payment by the author or research funder to cover the costs associated with publication. By submitting the manuscript to this journal, the authors agree to these terms. All manuscripts must be submitted in English.. Os artigos submetidos a partir de 1º de maio de 2022, que forem aceitos para publicação estarão sujeitos a uma taxa (Article Publishing Charge, APC) a ser paga pelo autor para cobrir os custos associados à publicação. Ao submeterem o manuscrito a esta revista, os autores concordam com esses termos. Todos os manuscritos devem ser submetidos em inglês.